crislazzeri@hotmail.com
Maria Inês Naujorks 2
minau@uol.com.br
Universidade Federal de Santa Maria
No horizonte das transformações educacionais, está se produzindo,principalmente a partir da década de 90, diversas análises acerca da instituição escolar,
sua função e dos sujeitos que ela busca ensinar. Dentro desse contexto, este artigo
pretende refletir, tendo como eixo a interface entre dois campos imprescindíveis da
educação, a saber, a gestão democrática e a inclusão educacional, a respeito da
escolarização de alunos com autismo e psicose.
Nesse sentido, este estudo tem a seguinte questão norteadora: como os gestores
educacionais percebem a inclusão de alunos com autismo e psicose, tendo em vista a
perspectiva da gestão democrática? Esse questionamento traz em seu bojo a interface
entre o campo da gestão educacional e da inclusão. As atuais políticas educacionais têm
como objetivo uma educação de qualidade para todos. Assim, a inclusão educacional e a
gestão democrática, na qual se destaca a descentralização do poder considerando todo
professor um gestor da educação, podem ser consideradas pontos essenciais para que se
alcance tal objetivo.
Para Michels (2006) a gestão e a educação inclusiva, juntamente com a
formação de professores, são eixos articulados que atribuem à escola, desde a década de 90, uma nova organização. A partir desse pressuposto teórico, a autora afirma que todos os professores são gestores da educação e da escola, sendo que esses profissionais são
1 Especializanda em Gestão Educacional e mestranda do curso de PósGraduação
em Educação pela
Universidade Federal de Santa Maria.
2 PROFª.DRª. pela Universidade Federal de Santa Maria orientadora deste trabalho.
responsáveis pela inclusão de alunos que vem sendo excluídos do sistema de ensino. “A
inclusão, então, aparece como propulsora de uma nova visão da escola. Agora sob a
narrativa do respeito às diferenças, oportuniza-se a educação diferente para compensar
as diferenças sociais” (p.407).
Nessa perspectiva, o aluno incluído não é de determinada professora ou da
educação especial e, sim, de toda a escola. Então, a inclusão educacional passa a ser de responsabilidade de todos os gestores da instituição escolar.
Assim, partindo dessa visão global de gestão e inclusão educacional, direcionarseá
este estudo para um público específico de alunos: alunos com autismo e psicose.
Com base nisso será realizada uma reflexão teórica acerca desse tema e, a fim de se
articular teoria e prática, estabelecer-se-á uma discussão com base em dados coletados junto a uma escola da rede pública estadual de Santa MariaRS.
É interessante delinear, ainda, a posição teórica adotada para pensar o autismo e
a psicose para se compreender que olhar será lançado sobre a questão da inclusão
educacional desses alunos.
No meio científico não há consenso sobre o diagnóstico nem sobre a etiologia do
autismo e da psicose infantil. É relevante discorrer acerca dessas imprecisões a fim de tratar da posição teórica aqui adotada.
A terminologia Transtornos Globais do Desenvolvimento é uma classificação
psiquiátrica do Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais – DSMIV
(2003), da Associação Americana de Psiquiatria, que inclui o autismo (Transtorno
Autista) e o que anteriormente se diagnosticava como psicose infantil. Para Kupfer
(2001, p.45), “embora tal classificação possa facilitar as trocas entre os profissionais da área, ela não produziu um avanço real na compreensão desses quadros, já que deles fornece apenas uma descrição”. Vale ressaltar, ainda, que estão incluídos na categoria de Transtornos Globais do Desenvolvimento o Transtorno de Rett, o Transtorno Desintegrativo da Infância, o Transtorno de Asperger e o Transtorno Global do Desenvolvimento Sem Outra Especificação.
3
Na Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID10
(1993), o autismo infantil está incluído na categoria “Transtornos Invasivos do
Desenvolvimento”. E é no autismo que essa classificação inclui a psicose infantil 3 .
Em ambos os documentos citados não há um diagnóstico diferencial entre autismo e psicose infantil. Segundo Kupfer (2001), os psicanalistas continuam utilizando os dois diagnósticos, porém não há um consenso sobre as diferenças dos
quadros.
O referencial teórico que neste artigo embasa a discussão acerca do autismo e da
psicose é a Psicanálise. Com base nisso, adota-se aqui a posição teórica que estabelece um diagnóstico diferencial, considerando o autismo e a psicose duas estruturas psíquicas distintas, o que não é consenso entre os psicanalistas. Jerusalinsky (1993; 2004a), Kupfer (2001) e LaznikPenot
(2003) são alguns autores que defendem essa posição e são tomados como referência na construção teórica. Então, ao abordar esta questão fazse referência especificamente ao autismo e à psicose, considerados neste trabalho, com base em uma leitura psicanalítica, duas estruturas psíquicas diferentes.
A INCLUSÃO EDUCACIONAL E A GESTÃO DEMOCRÁTICA: UMA
IMPORTANTE TESSITURA
O tema da inclusão é o foco da educação brasileira atualmente. Existe um fervor
nas escolas a respeito deste tema e das suas implicações no contexto escolar.
Com o surgimento da proposta de Educação Inclusiva a escola precisará
repensar sua estruturação enquanto instituição de ensino. Isto acarretará mudanças e
uma nova organização do sistema educacional, para receber na rede regular um público
que antes estava restrito às escolas e classes especiais.
O principal objetivo da educação inclusiva é acolher a todas as pessoas que
estiverem, principalmente, em idade escolar obrigatória e a todos que dela queiram
usufruir. E para isso está amparada em documentos nacionais e internacionais como: a
3 “Transtornos Globais do Desenvolvimento” e “Transtornos Invasivos do Desenvolvimento” são as traduções da expressão, em inglês, “Pervasive Developmental Disorders” no DSMIV (2003) e na
Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID10
(1993), respectivamente. Há alguns autores, como Kupfer (2001) e Colli; Amâncio (2000), que utilizam a terminologia “Distúrbios
Globais do Desenvolvimento”.
4
Constituição Federal (1989), LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
de 1996) e Convenção da Guatemala (1999), entre outros.
A Constituição Federal garante o direito a cidadania e dignidade (art.1°, inc. II e
III) e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3°, inc. IV). Além destes garante o
direito à igualdade no seu art. 5° e o direito de todos à educação nos artigos 205 e
demais subseqüentes. Com apenas estes artigos toda e qualquer instituição escolar tem o dever de atender a todos, não podendo realizar nenhum tipo de exclusão por cor, raça, sexo... Nestes parâmetros compreende-se também qualquer tipo de deficiência ou ausência dela.
No artigo 208 inc. III, também da Constituição Federal, está garantido o
atendimento educacional especializado “preferencialmente” na rede regular de ensino.
Nestes temos a Educação Especial tem o papel de complementar a aprendizagem dos
alunos com algum tipo de deficiência. Por exemplo, o uso da LIBRAS, do código
Braille, recursos de informática incluindo a Educação Especial que deve atuar em turno oposto, não podendo, de forma alguma, substituir a escolarização ministrada na rede regular de ensino.
O fato de a LDBEN citar nos seus artigos 58 e seguintes a Educação Especial,
gera confrontos com a constituição e, por isso, a Educação Especial deve ser entendida como atendimento especializado complementar que atravessa todos os níveis da educação regular sem substituíla, independentemente de idade e/ou comprometimento
apresentado pelo aluno. Por mais significativas que sejam as diferenças este tem o
direito de usufruir os benefícios do ambiente escolar.
A Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra a Pessoa Portadora de Deficiência (Convenção da Guatemala),
celebrada na Guatemala em 1999, surge como um novo documento, que no Brasil tem
valor de lei ordinária, para reinterpretar a LDBEN, anulando disposições contraditórias ou complementando falhas e/ou omissões.
A Convenção da Guatemala define discriminação como, Toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, antecedente de deficiência, conseqüência de deficiência anterior ou percepção.
Portanto nenhuma criança em idade escolar deve deixar de freqüentar a classe
regular, seja ela deficiente ou não. A Educação Especial como único recurso fere o que está proposto nesta convenção por ser um tratamento diferenciado em razão da
deficiência.
No entanto, a mesma convenção abre uma possibilidade para o atendimento
educacional especializado quando esclarece o que não se configura como discriminação,
(...) a diferenciação ou preferência adotada para promover a integração social
ou o desenvolvimento pessoal dos portadores de deficiência, desde que a
diferenciação ou preferência não limite em si mesma o direito à igualdade
dessas pessoas e que elas não sejam obrigadas a aceitar tal diferenciação ou
preferência. (art. 1°, n°2, “b”)
Outro ponto importante a ser mencionado diz respeito ao direito de opção
expresso no referido documento (Convenção de Guatemala) que dispensa o atendimento
educacional especializado, que só poderá ocorrer mediante a aceitação da pessoa com
deficiência ou responsável, não sendo obrigatório. Fato que não estava previsto na
LDBEN e com isso permitia que a escola encaminhasse para Educação Especial,
normalmente, por imposição, sem consulta aos pais ou alunos.
Porém, para que estas proposições realmente aconteçam é necessário muito
mais do que uma lei ou documento demonstrando o que é e como fazer o processo de
inclusão.
Na proposta de inclusão, o primeiro ponto a ser discutido diz respeito à
exacerbada preocupação em incluir, principalmente, para reparar a atitude excludente
que a escola tem tomado com as mais diversas formas de diferença, tais como, a
discriminação racial e social além de tantas outras, tendo o aluno como sendo a fonte do
problema sem rever seus métodos e posições políticosociais.
Para que a inclusão seja realmente efetivada nos moldes propostos pela lei e por
outros autores, é necessária uma revolução na escola atual, uma mudança de
paradigmas, como sugere Mantoan (2003). Essa mudança radical abrange, entre outros,
“Políticas educacionais formuladas e implementadas
aos auspícios da classificação e da seleção incorporam, conseqüentemente, a exclusão,
como inerente aos seus resultados, o que é incompatível com o direito de todos à
educação”. (Mazzota & Souza, 2000, pg 106).
Por isso, muito mais do que uma política educacional inclusiva é necessária que
haja uma conscientização social. Em uma sociedade onde os novos parâmetros são os da
competitividade, a inclusão e o atendimento segundo o ritmo de desenvolvimento de
cada um respeitando seus limites, parecem, no mínimo, incoerente.
“Portanto, a reformulação da escola para incluir os excluídos precisa ser uma
revolução que a ponha do avesso em sua razão de existir, em seu ideário
políticoideológico. É necessário muito mais do que uma reformulação do
espaço físico, de conteúdo programático ou de ritmos de aprendizagem, ou
uma maior preparação do professor”.(KUPFER & PETRI, 2000, pg 112)
Até o surgimento da obrigatoriedade escolar, todos tinham um lugar na
sociedade desde que exercesse uma ocupação digna, qualquer profissão como pedreiro,
carpinteiro, entre outros, era bem recebida socialmente. A partir da instalação da escola firmou-se também a oportunidade para poucos de escolarizarse e, com isso, as
diferenças sociais. Conforme Patto (1990) as diferenças individuais são uma criação
ideológica a serviço do ideário liberal e, por isso, foram historicamente engendradas.
Após o surgimento da escola nasce também a criança especial, ou seja, quem
não é capaz de aprender pelos moldes da mesma. Os testes de QI de Binet vem para
confirmar esses dados e classificar quem é escolarizável. A escola passa a ser
freqüentada por quem é capaz de cumprir metas de aprendizagem.
As políticas de inclusão exigem que haja justamente um movimento de reversão
dessa prática discriminatória. “Assim, a reabsorção do que ela não é ameaça a sua
consolidação como instituição. Reabsorver o que ela mesma criou como nãoescolar
é, inicialmente para ela, um contrasenso”.
(Kupfer & Petri, 2000, pg 112).
7
Diante do que está posto, a inclusão ainda tem muitos entraves a serem
superados, além de uma nova formulação ideológica, social e escolar, o que, por si só
demandaria trabalho bastante, existem outros problemas a serem questionados. Um
deles diz respeito ao extremismo da política de inclusão “Total”. Onde se encaixariam
as crianças com transtornos graves no desenvolvimento que, pelo menos em primeira
instância, não teriam condições psíquicas e/ou subjetivas para permanecer em uma sala
de aula do ensino regular?
O autismo, por exemplo, enquanto falha na constituição do sujeito, precisa,
assim como a psicose, de uma atenção mais singular a respeito da inclusão, em alguns
casos a falha na estruturação é tão significativa que estes sob hipótese alguma admitem a presença do Outro. Nesses casos a inclusão será, possivelmente, sem sucesso se for feita a qualquer custo.
Se a Constituição Federal, juntamente com a Convenção da Guatemala, não
admite que crianças em idade escolar estejam fora da escola, prevê como irregular o
atendimento educacional especializado fora do âmbito escolar sem que estas estejam no
ensino regular, como será feito o atendimento a essas crianças que não tem condições de freqüentar o ambiente escolar?
Como destacam Mazzota e Souza (2000), é preciso que se deixe de impor
slogans e procure consolidar intenções realísticas com uma política educacional objetiva e voltada para a inclusão social.
Por tudo isso, se a inclusão é produto de uma educação plural, democrática e
transgressora, como afirma Mantoan (2003), esta deve respeitar as individualidades e as possibilidades de cada um de estar, ou não, nas classes regulares.
Diante desta perspectiva, o modelo de escola inclusiva demanda uma nova
postura do sistema educacional. Porém, para que o modelo escolar inclusivo realmente
se efetive é necessária à participação de todos os profissionais da escola.
O sistema que era primordialmente instituído nas escolas, em que diretores e
supervisores trabalhavam independentemente dos docentes e estes por conseqüência não
compartilhavam das decisões administrativas e políticopedagógicas,
precisa ser superado em benefício de uma gestão educacional mais participativa.
Assim sendo, a proposta de gestão democrática vem ao encontro das
necessidades adquiridas pelo sistema de ensino inclusivo. A escola que segue uma
perspectiva de gestão democrática busca destacar a importância da participação de
todos, abrindo um espaço para as diversidades.
Conforme Libâneo; Oliveira; Tochi (2006, p. 328):
A participação é o principal meio de assegurar a gestão democrática,
possibilitando o envolvimento de todos os integrantes da escola no processo
de tomada de decisões e no funcionamento da organização escolar.
Assim como a gestão democrática, a proposta de educação inclusiva requer a
participação de todos os profissionais da escola em benefício da inserção efetiva dos
alunos incluídos. Não basta que o aluno esteja matriculado ou apenas freqüentando o
ambiente escolar, ele precisar fazer parte de todo sistema. A inclusão não se restringe à sala de aula, é preciso que toda a escola esteja sintonizada na busca do mesmo objetivo, uma educação de qualidade para todos que fazem parte da mesma.
O aluno não é só da professora, é de toda a escola”... Uma frase que insiste
em retornar – e que mobiliza tantas discussões entre nós – talvez porque as
experiências até aqui acumuladas demonstrem que, de fato, por mais que um
(a) professor (a) acolha e se empenhe em trabalhar com as crianças ditas
“diferentes”, se a escola como um todo não for capaz de se envolver e
assumir para si a responsabilidade pela escolarização desses alunos, o
processo de inclusão não se efetiva. (...). (AMÂNCIO & MITSUMORI,
2005, p. 97).
O envolvimento de todos os profissionais de uma escola em busca de um ensino
de qualidade para todos é o alicerce de uma gestão efetivamente democrática. Mas para
isso é necessário que estes profissionais abandonem a idéia de homogeneização e
entendam que cada aluno é único no processo de ensino aprendizagem.
Uma gestão democrática possui o respeito às diferenças como prioridade em seus estatutos. Os alunos com necessidades especiais ou necessidades educacionais especiais devem ser respeitados na sua diferença, enquanto sujeitos únicos, assim como os demais alunos da escola a qual estão inseridos.
Segundo Lücke (2001), a gestão democrática pressupõe um trabalho integrado
em que todas as pessoas que fazem parte da comunidade escolar possam participar das
decisões e vivências do cotidiano da escola e que esta possa se tornar um ambiente de
participação e respeito às diferenças.
Para isso, as concepções antigas de igualdade, no sentido de homogeneidade, e
padronização na aprendizagem, devem dar espaço a conceitos como respeito às
diferenças, autonomia e heterogeneidade no contexto escolar.
9 Assim, o abandono, o assistencialismo, a piedade, a visão clínicomédica
da questão da deficiência ainda impregna nossas concepções. Reconhecêlas
é um significativo passo na construção de uma escola democrática que atenda
as demandas de seus alunos e não somente busque enquadrálos
dentro de modelos idealizados de “bom” ou “mau” aluno. [...]. (MAGALHÃES, 2003,
p. 32).
No caso dos alunos com Transtornos Globais do Desenvolvimento, o processo
de inserção escolar torna-se mais complicado. Esses alunos são, freqüentemente,
discriminados por sua diferença, pois demonstram um funcionamento intelectual
atípico, ou seja, não aprendem como os “outros”. O que não quer dizer, de maneira
alguma, que sejam incapazes, porém é fator de angústia para os professores.
Por isso, em muitos casos a inclusão de alunos com autismo e psicose restringese
ao caráter social. Encontram-se nas escolas com o objetivo único e exclusivo de
socializar-se o que dificulta o acesso à aprendizagem.
Tal posicionamento pode ser muito prejudicial se levarmos em conta que esses
alunos aprendem. Os alunos com Transtornos Globais do Desenvolvimento possuem as
chamadas “ilhas de inteligência”, ou seja, faculdades mentais e intelectuais intocadas que podem desaparecer de não forem trabalhadas como nos mostra Kupfer e Petri: As crianças psicóticas e autistas possuem ilhas de inteligência preservadas,
que podem desaparecer caso não as ajudemos a lhes dar sentido. Podem por
falta de sentido, direção, porque não são utilizadas para alcançálas
no Outro, desaparecer, ou se transformar em estereotipias. Assim, a freqüência
à escola acaba sendo um instrumento crucial, se não de crescimento, ao
menos de conservação das capacidades já adquiridas. (KUPFER & PETRI,
2000, p.116).
A escola pode servir como uma ferramenta terapêutica 4 para estes alunos. O
ambiente escolar da maneira como é organizado, com as suas normas e leis, pode agir
de forma estruturante para estes alunos, permitindo que aprendam a suportar regras e
frustrações.
Estar na escola, para as crianças com Transtornos Globais do Desenvolvimento
significa muito mais do que cumprir a lei inclusiva, para estas crianças a escola
4 “A educação terapêutica, termo cunhado para fazer face a um tipo de intervenção junto a crianças com problemas de desenvolvimento[...] é um conjunto de práticas interdisciplinares de tratamento, com especial ênfase nas práticas educacionais, que visa à retomada do
desenvolvimento global da criança[...]”(KUPFER, 2001, p. 83).
10 enquanto uma organização social permite o estabelecimento de um laço social, além da família, e a possibilidade de interação com outras crianças.
(...) preconizar a ida à escola (...) é mais do que um mandamento político,
que reza sobre os direitos do cidadão (...) ir à escola, para a criança
psicótica, tem valor terapêutico. Ou seja, a escola pode contribuir para a
retomada ou a reordenação da estrutura perdida do sujeito. Este alvo, que
não consta da política inclusiva, é o diferencial presente no eixo da inclusão
proposto pela educação terapêutica. (KUPFER, 2001, p.90).
Assim, a escola assume um papel importante para as crianças com Transtornos
Globais do Desenvolvimento, tendo em vista que “a escola é uma instituição poderosa
quando lhe pedem que assuma uma certidão de pertinência: quem está na escola pode
receber o carimbo de ‘criança’” (Kupfer, 2001, p. 92).
Porém, nem sempre a escola terá valor terapêutico, em alguns casos o ambiente
escolar poderá ser extremamente angustiante e ameaçador. Isto irá depender da
estruturação subjetiva em que o aluno com Transtorno Global do Desenvolvimento se
encontra.
Sendo assim, a inclusão não pode ser feita a qualquer preço. Existem alunos que
não estão preparados subjetivamente para desfrutar do ambiente escolar regular, o que
não quer dizer que não possam usufruir os benefícios das escolas ou outros recursos que ela possa oferecer. Estas podem ser consideradas inclusivas na medida que poderão
servir como trampolim para inclusão na classe regular.
É preciso parar de pensar a inclusão apenas pelo caráter técnico buscando
respostas apenas para as questões práticas de “como fazer”, a inclusão envolve o que há de mais singular na aprendizagem, ou seja, a subjetividade do aluno. Antes de responder “como fazer”, é preciso levar em conta singularidade de cada sujeito e perguntarse “para que fazer”, esta é a verdadeira questão da política inclusiva.
Tendo em vista a amplitude do contexto educacional e que esta é uma pesquisa
da área das ciências sociais e humanas, para a realização deste trabalho de pesquisa,
utilizar-se-á uma abordagem qualitativa, que de acordo com Minayo (2002, p. 2122)
trabalha, “(...) o universo dos significados, motivos, aspirações, crenças, valores e
atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e
dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis”.
11
Para responder a questão de pesquisa anteriormente apresentada foi efetuada,
inicialmente, uma revisão bibliográfica, a fim de aprofundar os conhecimentos teóricos sobre os temas Autismo e Psicose e Gestão Democrática. Esta fase da pesquisa é bastante importante, pois é preciso conhecer o que está sendo produzido na área de
interesse do pesquisador.
O processo de avaliação do material bibliográfico que o pesquisador
encontra lhe ensinará até onde outros investigadores têm chegado em seus
esforços, os métodos empregados, as dificuldades que tiveram de enfrentar,
o que pode ser ainda investigado etc. (...) “. (TRIVIÑOS, 1987, p. 99100)”.
Posteriormente, foi realizada a coleta de dados em uma escola da rede estadual
de ensino do município de Santa Maria, onde se encontram incluídos três alunos com
autismo e psicose, sendo eles, dois com autismo e um com psicose infantil. A intenção
de realizar a pesquisa nessa escola se deu pelo número significativo de alunos com
autismo e psicose incluídos na instituição.
Os sujeitos participantes da pesquisa foram dois profissionais da direção e
supervisão, dois docentes e dois familiares de aluno, no intuito de respeitar o preceito da gestão democrática, de que todos na comunidade escolar fazem parte da gestão da escola. O instrumento de coleta de dados foi entrevista semiestruturada.
As entrevistas foram registradas, com autorização dos sujeitos participantes, e devidamente transcritas.
“Esse instrumento tem sido empregado em pesquisas qualitativas como uma solução
para o estudo de significados subjetivos e de tópicos complexos demais para serem
investigados por instrumentos fechados num formato padronizado”.(BANISTER et al.,
apud SZYMASKI, 2004, p. 10).
Ao final deste percurso será feita a análise dos dados recolhidos em
conformidade com a perspectiva teórica adotada. A abordagem que será utilizada na
análise dos dados será Análise de Conteúdo.
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