quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

NEURÔNIOS DE AUTISTAS

Pesquisa conseguiu reprogramar neurônios autistas em normais

Gabriella Bontempo



Uma pesquisa divulgada na revista "Cell" americana deu nova esperança aos portadores de autismo. Alysson Muotri e cientistas brasileiros conseguiram transformar, em laboratório, neurônios de portadores de um tipo de autismo conhecido como Síndrome de Rett em células saudáveis. O estudo, mesmo que em fase de análise, empolgou pais e professores da Escola Classe 405 Norte - referência em educação para autistas. A diretora Marilena Oliveira considerou um passo importante no estudo dessa disfunção. "Acaba criando na gente uma expectativa quanto ao tratamento. Quem sabe mais para frente não se descubra o autismo e outras síndromes ainda no útero", disse.
Para Eloísa Masson, mãe de uma criança autista que estuda na escola, a divulgação dos resultados veio como uma grande notícia. "É fantástico e a expectativa é enorme, porque quando o meu filho foi diagnosticado, aos quatro anos, o conceito era muito vago. Com esse estudo, agora sei que há uma diferença entre células normais de células autistas", ressaltou. Além disso, Eloísa fez questão de parabenizar os cientistas. "Mesmo que eles estejam nos Estados Unidos, somos brasileiros e temos que nos orgulhar desse trabalho feito por brasileiros", afirmou.
A primeira vez que o autismo foi descrito na medicina foi em 1943, quando o médico Kanner identificou crianças apresentando prejuízos nas áreas da comunicação, do comportamento e da interação social. Ele caracterizou essa condição como sendo única e não pertencente ao grupo das crianças com deficiência mental. Propôs o nome de Autismo para chamar a atenção para o prejuízo severo na interação social que era muito evidente desde o início da vida desses pacientes.
Com o passar do tempo e mais conhecimentos a respeito desse tipo de condição, surgiu a denominação de Transtornos Globais ou Invasivos do Desenvolvimento (TGD) que incluía, além do autismo, a Síndrome de Asperger, a Síndrome de Rett e o Transtorno Global do Desenvolvimento Sem Outra Especificação (TGDSOE). O Brasil ainda não possui nenhum dado estatístico sobre o transtorno no País. Sabe-se que, nos Estados Unidos, a cada 175 crianças recém-nascidas, uma é portadora de uma das síndromes que afeta a maneira como esses indivíduos se comunicam e interagem.
O psicólogo e coordenador de pesquisas do Movimento Orgulho Autista Brasil (MOAB), Gleidson Gabriel, explicou que o autismo tem três eixos-base: a comunicação (alguns indivíduos são verbais e não verbais), apresentam comportamento repetido, metódico e não interagem com o meio. Segundo ele, há uma demora para se diagnosticar a doença no Brasil, uma média de sete anos, uma vez que são realizados inúmeros testes para identificar até onde esses três níveis estão comprometidos. "Em termos de dados e diagnósticos, o Brasil está atrasado em relação a outros países", lamentou. Inovações pioneiras como o da ONG e da Escola Classe 405 Norte, capacitam pais e a sociedade a melhor se relacionar com os portadores do transtorno. "Esse trabalho não é fácil, pois lidamos com os diferentes níveis de conhecimento sobre a doença", explicou a professora Simone Lara dos Reis.
Organizações Não Governamentais também celebraram o resultado da pesquisa. Segundo a presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil, Adriana Alves, mesmo que o processo ainda seja longo, já traz uma esperança para familiares e autistas. "Mostrar que é possível modificar a célula já é muito bom, imagina poder vivenciar isso", ressaltou. Para Adriana, que é mãe de um adolescente autista, a interação social com o passar dos anos passa a ser um desafio, por isso que a ONG atua para capacitar a família e a sociedade para lidar com os portadores do autismo. Outra dificuldade apontada é que a maioria dos autistas são não verbais, ou seja, não utilizam a fala na comunicação dos interesses, por essa maneira é mais complicado entendê-los.
A revelação de que neurônios autistas podem ser corrigidos por meio do uso de substâncias que reprogramam a célula, cria a perspectiva de se desenvolver tratamentos para combater uma doença ainda muito estigmatizada pela sociedade.
Na pesquisa dos brasileiros, para analisar diferenças entre os neurônios, os cientistas fizeram uma biópsia de pele de pacientes com e sem autismo. Depois, reprogramou as células da pele em células de pluripotência induzida (iPS) - idênticas às células-tronco embrionárias, mas não extraídas de embriões. "Pluripotência" é a capacidade de toda célula-tronco de se especializar, ou diferenciar, em qualquer célula do corpo. Assim, as iPS também podem dar origem a células de todos os tipos, o que inclui neurônios.
Comparando os dois tipos, o grupo verificou que o núcleo dos neurônios autistas e o número de ramificações que atuam nas sinapses - contato entre neurônios, onde ocorre a transmissão de impulsos nervosos de uma célula para outra - é menor. Identificados os defeitos, o trio experimentou duas drogas para "consertar" os neurônios autistas: fator de crescimento insulínico tipo 1 (IGF-1, na sigla em inglês) e gentamicina. Tanto com uma substância quanto com a outra, os neurônios autistas passaram a se comportar como se fossem normais.
Lenise Garcia, bióloga celular da Universidade de Brasília (UnB) saudou o estudo. "É uma pesquisa extremamente interessante porque está sendo feita com células-tronco adultas não com as embrionárias", afirmou. Segundo ela, a análise ajuda a legitimar a pesquisa com esse tipo de célula reprogramada. "A pluripotência faz com que, por meio da modificação de três ou quatro genes responsáveis por determinadas funções, as células se tornem semelhantes às embrionárias, podendo se transformar qualquer célula do corpo", explicou. Mesmo com o avanço, a bióloga alerta que o processo é demorado. "Daqui para frente deve-se atentar para a segurança do paciente, fazendo outros testes, inclusive em camundongos, para depois prosseguir com os seres humanos", afirmou. Para a bióloga, a cultura das células no laboratório cria oportunidades para se pesquisar remédios para o tratamento do autismo e outros transtornos.
O estudo, que baseou-se na Síndrome de Rett (um tipo de autismo com maior comprometimento e com comprovada causa genética), foi coordenado por mais dois brasileiros, Cassiano Carromeu e Carol Marchetto, e foi publicado na revista científica Cell. Além desse estudo, outra pesquisa coordenada por Alysson Muotri, que saiu na revista americana "Nature", deste mês, mostrou que o cérebro de crianças com Síndrome de Rett, uma das formas de autismo, apresenta um aumento da atividade de "genes saltadores". Esses genes são sequências de DNA repetitivas no genoma que aparentemente não têm nenhuma função. Entretanto, foi descoberto que eles se multiplicam no genoma neuronal por meio de um mecanismo de "copiar e colar", aumentando o número de sequências no DNA do indivíduo.
Para Eloísa, a expectativa continua mesmo que o filho dela não seja o beneficiário. "Sei que não vai ser uma coisa milagrosa, mas pode dar resultados. Já é um grande passo para se entender e para curar", concluiu.


FONTE: http://www.unb.br/noticias/unbagencia/cpmod.php?id=79963

Um comentário:

  1. tambem tenho um filho de 11 anos autista e gostei muito dessa reportagem espero que um dia se torne real .

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