Renata Martins Dias
Jornalista, formada pela Universidade do Vale do Paraíba; escreve diariamente
no Portal Planeta Educação.
Pedagogia
por Mércia Falcini
Quando pensamos na formação de um ser humano completo, deixamos de acreditar nas disciplinas isoladas, facilitando a aceitação e a adaptação do aluno especial na sala de aula.
A inclusão, apesar de todos os mitos, é um processo simples que permite o crescimento holístico dos agentes envolvidos no processo.
O projeto que vem sendo desenvolvido pela Escola de Educação Infantil Lua Crescente, Salto, SP (onde sou a coordenadora do projeto) revela algumas dicas importantes para os professores que desejam ou necessitam desenvolver o mesmo trabalho.
Em primeiro plano, a Instituição que aceita o desafio de incluir, deve contratuar com os pais do aluno especial, a necessidade da criança receber atendimento dos especialistas de apoio. Geralmente são fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, neuropediatras, entre outros. Tais suportes são extremamente importantes para o desempenho do aluno em sala de aula.
O Processo na Escola: dicas aos professores
Adaptação e Socialização: não gere expectativas, nem a você mesmo, muito menos ao aluno. Deixe a criança livre e natural, convide-a para participar das suas atividades. Planeje atividades simples e rotineiras, dê preferencia para atividades que fazem parte do domínio caseiro. Observe - a .
É nesse momento que surge as dúvidas, os questionamentos e a necessidade de traçar a metodologia. Anote todas as dúvidas e observações, que serão as diretrizes das pesquisas. Durante o período de adaptação inicia-se também o período de pesquisa e capacitação da equipe pedagógica.
Dica: A nossa equipe manteve durante quase um ano reuniões periódicas com todos os profissionais responsáveis pela estimulação extra escolar. Fonoaudióloga, Terapeuta etc. Hoje os encontros são mais esporádicos.
O processo de socialização geralmente é demorado, porém o mais importante é tentar manter a criança em grupo, apesar da sua tendência em isolar-se. Cabe ao professor planejar atividades grupais, principalmente em ambientes livres, como parque, pátio e arei. Nesse período introduza nas aulas atividades onde o aluno especial possa expressar comportamentos imitativos, contribuindo para auto-estima e colaborando para sua socialização. Contar com o apoio dos demais alunos da classe é fundamental - se for explicado de maneira clara e objetiva, os alunos compreendem e solidarizam com o problema apresentado e ainda se disponibilizam para contribuir com os objetivos do professor - garantindo a união da classe.
Desempenho Cognitivo : a assimilação e a acomodação do conteúdo pedagógico é sempre muito lento. Esse fator deve ser considerado pelo professor que deverá respeitar e aceitar. O aluno especial irá conduzir o ritmo e expressar qual a melhor maneira de aprender, por isso o professor deve estar aberto e flexível a novas formas de trabalho. O aprendizado através da repetição pode ser bem sucedido , mas não se deve determinar a melhor ferramenta. Variar (a variação acontece muitas vezes de forma individual, conforme cada etapa do conteúdo desenvolvido) e explorar diferentes metodologias é o melhor caminho. O aluno especial tem o direito de ser incluído na mesma metodologia adotada pela Escola.
Professor: o responsável pelo grupo que incluiu um aluno especial deveria ser capacitado para tal. Enquanto isso não ocorre por via da formação acadêmica/ universitária, resta somar as boas experiências e a prática profissional recheada de insistência e perseverança para encarar o grande desafio de oferecer as crianças portadoras de deficiências físicas ou mentais a oportunidade de uma melhor adaptação na sociedade, qualificando assim, a vida de todos.
Nota: propositadamente não inclui o item avaliatório no processo escolar, por acreditar que a avaliação não se aplica, principalmente nesse projeto, formalmente. É preciso uma avaliação conjunta com todos os agentes envolvidos na história do aluno, desde os pais, demais profissionais e a Escola. Afinal estamos trabalhando com vidas e não com um simples conteúdo acadêmico.
Como diz o Professor Reuven Feurstein - psicólogo e um dos maiores contribuidor da psicopedagogia atual - "Não devemos permitir que uma só criança fique em sua situação atual sem desenvolvê-la até onde seu funcionamento nos permite descobrir que é capaz de chegar. Os cromossomos não têm a última palavra".
Sugestões de livros para leitura e pesquisa: SCHWARTZMAN , José Salomão e colaboradores - "Síndrome de Down"- Editora Mackenzie , São Paulo, 1999.
WERNECK, Claudia - "Ninguém mais vai ser bonzinho, na sociedade inclusiva" - Editora WVA, Rio de Janeiro, 1997.
MANTOAN, Maria Teresa Eglér e colaboradores - "A integração de pessoas com deficiência" - Editora Memnon Edições Científicas Ltda.,1997
O projeto está sendo desenvolvido na Escola de Educação Infantil Lua Crescente, na cidade de Salto, SP, coordenado por Mércia Falcini, pedagoga e responsável por diversos trabalhos educacionais desenvolvidos aos professores da cidade e região, e executado pela professora Elisângela Luiz. O nosso aluno especial é Leandro Cardoso Nicácio, nascido em 23.09.97, hoje com 2 anos de idade, portador de síndrome de Down. Uma criança encantadora e que nos ensina que há na vida muito mais do que simplesmente o intelecto.
Depoimento de Elisângela Luiz, professora do Leandro
"A minha primeira experiência com criança especial está acontecendo com o Leandro, e certamente vem sendo muito gratificante. Posso conhecer seus sentimentos, suas capacidades e suas fraquezas. Quando o Leandro começou a freqüentar a minha classe, pensei de maneira simplista que seria o máximo ter uma criança especial envolvida no grupo. Os dias foram passando e eu me dei conta de que eu não sabia como trabalhar com ele e comecei a me preocupar. Partindo das minhas preocupações e das reuniões com minha coordenadora, fui entendendo que precisava me capacitar, mantendo a perseverança onde repetia freqüentemente os objetivos desejados com ele. E assim com toda motivação do mundo fui vencendo os desafios e conhecendo cada vez mais sobre crianças portadoras da síndrome de Down.
Os resultados demoraram, muitas vezes despertando dúvidas sobre o que estava fazendo, mas quando o Leandro começou a expressar o seu aprendizado, pude sentir que não havia palavras para definir a satisfação e alegria que invadiram a todos os envolvidos no projeto, principalmente a mim. Por isso afirmo que a inclusão é o passo mais correto na vida das pessoas portadoras de qualquer deficiência. A interação com outras pessoas pode despertar aprendizados eternos para a conquista de um espaço digno e promissor, garantido esperança de futuro na sociedade."
Educação Especial
Diga não à Exclusão
A escola inclusiva é uma tendência internacional. Considera-se escola inclusiva aquela que abre espaço para todas as crianças, abrangendo aquelas com necessidades especiais. O principal desafio é desenvolver uma pedagogia centrada na criança.
Essa escola deve ser capaz de educar a todas, sem discriminação, respeitando suas diferenças, oferecendo respostas adequadas às suas necessidades, solicitando o apoio de especialistas e de instituições quando julgar necessário. O processo de integração deve fazer parte do projeto educativo da instituição.
A qualidade do processo de integração, segundo os referenciais, depende da estrutura organizacional da instituição, pressupondo e considerando as seguintes particularidades:
• Grau de deficiência e as potencialidades de cada criança;
• Idade cronológica;
• Disponibilidade de recursos humanos e materiais existentes na comunidade;
• Condições socioeconômicas e culturais da região;
• Estágio de desenvolvimento dos serviços de educação especial, já implantado nas unidades federais.
As principais mudanças na escola inclusiva:
• Certezas: de que as demais crianças vão se tornar solidárias, pois naturalmente aprendem a conviver com as diferenças;
• Os pais dos outros alunos passam a se interessar mais por uma realidade que antes não os afetava;
• Dúvidas: não é possível saber como a chegada de um aluno especial poderá ou não interferir no desempenho escolar do resto da turma;
• Não existem pesquisas ou estudos que comprovem que a convivência e comparação com os novos amigos possam afetar emocionalmente a criança especial.
Ultrapassar o preconceito significa trabalhar com o potencial do indivíduo e, não questões adjacentes. Acreditar nas possibilidades do indivíduo é basear o seu trabalho nos desenvolvimentos real e potencial deste, extinguindo a idéia de que para a criança com necessidades especiais, a aprendizagem consiste somente em atividades de rotina como higiene, maneiras de portar-se à mesa ou em festas ou, mesmo, amarrar um cadarço de sapato.
A aprendizagem deveria, além disso, capacitar o indivíduo ao convívio, participação e auto-sustentação na sociedade. Isto implica, necessariamente, o não abandono de objetivos curriculares relativos, também, ao desenvolvimento intelectual do cidadão, ou seja, os de leitura, escrita e cálculo, conforme prevê a própria Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990).
A postura do educador perante a diversidade de seus alunos, oferecendo oportunidades de construção do conhecimento e respeitando o ritmo próprio de cada um, pode ser considerado um primeiro passo para a superação do preconceito. Esta postura, não advém somente da prática cotidiana; deve estar interligada a um conhecimento científico que revela o desenvolvimento da criança nos níveis afetivo, cognitivo e social, e suas respectivas relações com os processos de aprendizagem de cada indivíduo. Afinal de contas, a aprendizagem ocorre para qualquer indivíduo.
O conhecimento científico permitirá ao educador elaborar, ressignificar o currículo de acordo com sua realidade e contexto histórico-social; vislumbrar um planejamento flexível ao grupo e a cada criança em sua singularidade, utilizando-se de metodologias eficazes.A formação de educadores, numa idéia prospectiva, deve firmar-se numa transformação: a passagem de uma atenção centrada numa pequena percentagem de crianças consideradas como tendo dificuldades de aprendizagem para uma atenção que engloba todas as crianças.
Os educadores devem concentrar seus esforços na melhoria da forma como enfrentam a diversidade, cuja educação deve objetivar ajudar todas as crianças a terem sucesso na escola (na sociedade), incluindo as que têm de ultrapassar deficiências ou dificuldades específicas.
Educação Especial deve ser a aliada na pesquisa e no desenvolvimento de novas formas de se ensinar, adequadas à heterogeneidade dos alunos e compatíveis com os ideais democráticos, na função de orientação, supervisão e acompanhamento das condições educacionais apropriadas num interjogo entre o real e o necessário.
Em escolas eficazes para todos, o ambiente de colaboração trabalha baseado no enriquecimento dos intercâmbios intelectuais e culturais. Para que o educador trabalhe neste ambiente ideal faz-se necessário apoio emocional e estímulos profissionais através da valorização docente e da capacitação contínua. Também, função da Educação Especial.
Há bem pouco tempo, a Educação Especial trabalhava somente com o que concernia aos grupos excluídos em função de suas deficiências, programando atividades somente para os educadores que possuíam crianças “especiais” e não toda a escola, ou toda a rede. Bastava que apenas o professor desses alunos obtivesse o conhecimento sobre elas.
O professor que possuía somente alunos “normais” não adquiria o conhecimento importante e necessário, evidenciando muitas vezes, sua desmotivação e sua desvalorização acerca dos alunos da educação especial.
No processo de redefinição da educação especial, a reformulação das habilidades dos profissionais que se especializaram em ‘Educação Especial’ possibilita enxergarmos os profissionais que lidam com as pessoas com necessidades especiais da mesma forma que seus alunos são sempre vistos: como meros objetos a serem padronizados.
Para que esse processo se solidifique, duas dimensões devem estar presentes e unificadas: comunidade escolar e campo de atuação.Dessa forma, a educação se especializará para todos na medida em que removermos as barreiras políticas, sociais e econômicas referentes aos grupos excluídos.
Não é suficiente capacitar e reciclar somente educadores “responsáveis" pela criança especial. Por comunidade escolar queremos dizer a direção, educadores, funcionários de apoio (merendeiras, bibliotecárias), responsáveis e não-responsáveis de alunos (amigos da escola). Por campo de atuação, referimo-nos à educação especial no sentido tradicional e estrito do termo, com seu grupo técnico. Estas duas dimensões, ao estarem unificadas, viabilizarão a exclusão.
Ao reconceituar a educação especial, extinguindo seu caráter paralelo à educação regular, idealizando “Educação para Todos”, estamos buscando alcançar a diversidade humana. Diversidade de cor da pele, de crenças religiosas, de sexos, de maneiras de aprender... que a sociedade finge incluir, mas na verdade fica tudo no papel. Na realidade desejamos desmistificar o sistema educacional finalizado num padrão, favorecendo a remoção de barreiras para a aprendizagem e participação de todo e qualquer indivíduo.
“Ter um filho especial implica mudar radicalmente o nosso ponto de vista sobre o mundo, reavaliar os valores. Aceitar uma criança com limitações e confiar em sua recuperação exige esforço e consiste em um grande avanço, mesmo para os pais. Pais de crianças diferentes não convivem apenas com renúncia, abnegação e sofrimento. Um filho diferente exige, sim, muita dedicação. Exige amor, fé e paciência para ensiná-lo a tornar-se dono do próprio futuro.”
Rejeitar a matrícula de uma criança especial é crime sujeito a pena de prisão.
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