sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

A MENTE DO ANALISTA E AS TRANSFORMAÇÕES AUTÍSTICAS



Célia Fix Korbivcher
I
A experiência de analisar alguns pacientes em que predominam manifestações da mente primitiva, áreas de não-representação, especificamente os “estados autísticos”, (Tustin,1981) tem se constituído para mim num valioso estímulo para reflexão.
É freqüente em nossa prática clínica sermos convidados a compartilhar com nossos pacientes, sejam eles neuróticos, psicóticos, ou autistas, experiências para as quais, muitas vezes, não encontramos em nosso instrumental teórico-clínico, nem em nosso repertório pessoal, representações que nos permitam identificar o fenômeno em curso, de modo a nos aproximarmos desses pacientes e alcançá-los.
Frente a estas situações, muitas vezes, instala-se em nossas mentes uma atmosfera caótica devido à desorganização ocasionada nos sistemas de referência por nós utilizados, dificultando a manutenção do vértice psicanalítico. Os fenômenos proto-mentais, e particularmente os fenômenos autísticos, mesmo quando encontrados em pacientes neuróticos, as transformações autísticas (Korbivcher,2001), a meu ver, podem provocar este tipo de desorganização.
Indago: de quais instrumentos o analista dispõe, ao ser exposto a essas áreas primitivas da mente, para identificar, reconhecer, transformar, dar significado a comunicações para as quais ele, muitas vezes, não encontra em sua mente qualquer representação que lhe permita orientar-se, uma vez que as fantasias eventualmente subjacentes a elas não são captadas como elementos psíquicos? Como pode o analista acolher, conter esses fenômenos, exercer a sua capacidade de rêverie e de função alfa frente a experiências emocionais para as quais não encontra em si o registro de experiências semelhantes sobre as quais se apoiar? Como transitar nesse universo, penetrar nos refúgios autísticos gerados pelo indivíduo a partir de suas próprias sensações corporais? E, estando nessa condição, como pode o analista exercer sua função alfa?
Essas são indagações que não têm como objetivo obter respostas, mas têm a função de propor alguns elementos para que essa reflexão se expanda.
Em meus trabalhos anteriores procurei examinar esses fenômenos. Em “Mente primitiva e pensamento” (Korbivcher, 1999), reflito sobre a necessidade de o analista discriminar, na mente primitiva diferentes níveis de desenvolvimento mental para que a sua abordagem alcance o nível em que paciente se encontra. Em “Teoria das Transformações e os estados autísticos. Transformações autísticas: uma proposta” (Korbivcher, 2001), sugiro incluir na Teoria das Transformações de Bion (1965), o grupo de transformações autísticas1, no qual o fenômeno autístico é predominante na experiência emocional compartilhada entre analista e analisando.
As transformações autísticas (Korbivcher 2001) tais como as concebo, caracterizam-se por desenvolverem-se num meio autístico, o que implica na ausência da noção de objeto externo e interno e são estados dominados por sensações que não adquirem representação na mente. Algumas das invariantes nelas salientadas se relacionam à experiência de “ausência de vida afetiva”, “experiência de vazio afetivo”, à presença de “atividades auto-sensuais” observadas através da relação de objetos autistas e de formas autísticas.
Neste trabalho3 aprofundo o exame acerca dos processos que ocorrem na mente do analista ao ser submetido ao impacto de manifestações da mente primitiva, mais especificamente, transformações autísticas. Exploro a necessidade de se delimitar o universo autístico, universo este que se apresenta sob o domínio das sensações. Sendo assim as leis que o governam são leis próprias, bastante diferentes daquelas do âmbito da neurose e da psicose. Dentro dessa perspectiva exploro a possibilidade de que esse universo possa vir eventualmente a constituir um novo paradigma para a psicanálise. Através da apresentação de material clínico de pacientes: Luis, Caio, duas crianças autistas e Ana, paciente que opera com a parte neurótica da personalidade e que apresenta núcleos autistas, predominando, portanto, transformações autistas, essas questões serão abordadas visando expandir a discussão.

II
Segundo Bion, nos estados proto-mentais o físico e o mental não se discriminam. Encontramo-nos em uma área em que a mente ainda não se desenvolveu e em que predominam elementos sensoriais. Muitas vezes, mesmo por trás da parte neurótica da personalidade, há uma parte em que predominam núcleos encapsulados e impenetráveis do self, núcleos esses resistentes a mudanças, que acarretam a falta de contato emocional. Esses estados emocionais produzem fenômenos semelhantes às defesas autístitas, cuja finalidade é proteger o self primordial dos estados intoleráveis de não-integração (Tustin, 1986 e Klein, S., 1981).
Os fenômenos autísticos encontrados nos estados autísticos, se caracterizam pela presença de um estado de “recolhimento emocional” no interior de uma “concha protetora”, auto-gerada . O self se retira do contato afetivo com o objeto gerando em torno de si essa “concha protetora” dentro da qual realiza atividades auto-sensuais, bastando-se a si mesmo com elas, e com isso se protege da dor decorrente da consciência da separação corporal do objeto. Estas manobras protegem o indivíduo de vivências de terror as quais lhe acarretariam uma sensação de desagregação, e de vulnerabilidade intolerável. Tustin (1986,1990).
Nesses estados o que se observa é que não se constitui um aparelho mental capaz de inscrever e representar os impulsos advindos do corpo, de modo a que adquiram qualidades psíquicas. O indivíduo está situado num mundo dominado pelas sensações; as relações entre self e objeto ocorrem através de relações de “objetos-sensação”, objetos e formas autistas (Tustin, 1981). “O anseio destes indivíduos é mais por sensações do que por objetos; eles reagem às pessoas pelas sensações que elas lhe provocam” (Tustin, 1986).
Alguns pacientes que apresentam esses estados comunicam-se de forma não verbal, predominantemente através da sensualidade.
Luís, uma criança autista de 6 anos, que me foi encaminhada para análise, ilustra essas questões. Segundo os pais, Luís não estabelece qualquer contato com o mundo externo. O pai, uma figura assustadora devido ao seu porte muito grande, conta que o filho reage apenas quando ele lambe todo o seu rosto. O pai nota em Luís manifestação de gozo e de prazer e que Luís mantém-se neste tipo de contato com o pai por um longo período, até que se incomoda com o excesso de saliva em seu rosto. Interrompe para limpar-se, mas volta em seguida e ali permanece. Os pais relatam também que notaram que Luís era insensível à dor. Perceberam que Luís, muitas vezes, se machucava e não reagia. Foram orientados pelo pediatra para escovarem com uma bucha a pele de todo o seu corpo de modo a torná-la mais fina e sensível. Notaram que Luís, com o tempo, passou a reagir. Comentam ainda que Luís, em qualquer lugar que esteja, urina dentro de algum recipiente que encontra à sua volta e a seguir ingere aquele conteúdo. Muitas vezes manifesta também coprofagia.
Penso que Luís é um exemplo curioso, vivo, quase didático num grau extremo, do campo de manifestações autísticas. De um lado, Luís constrói a partir de sua pele insensível, grossa, uma “concha protetora” que o impede de ser atingido pela dor da separação corporal do objeto e, de outro lado, demonstra de maneira explícita a relação de continuidade que estabelece a partir das sensações que obtém através da língua e da saliva do pai na pele de seu rosto. Além disso, Luís demonstra que não necessita de nada que venha de fora, nutrindo-se de seus próprios excrementos.
Outros pacientes, nos quais predominam a parte neurótica da personalidade, e que apresentam núcleos autísticos, desenvolvem manobras autísticas, operando conforme propus através de transformações autísticas, (Korbivcher, 2001). É necessário, entretanto, salientar que a proposta de transformações autísticas se aplica somente aos pacientes neuróticos que apresentam núcleos autísticos e não a pacientes propriamente autistas. Estes pacientes, os neuróticos com núcelos autísticos, oscilam entre estados autísticos e estados em que a mente opera e que é há a possibilidade de efetuarem em certo grau; transformação, mesmo que seja autística. Já os pacientes autistas encapsulados, como ocorre com Luís e com Caio, (criança que apresentarei mais adiante) , não há a possibilidade de haver transformação.
A linguagem verbal é o meio de comunicação mais freqüente dos pacientes neuróticos que desenvolvem barreiras autísticas, porém o que se observa é que pelo fato de se recolherem em atividades auto-sensuais e as relações serem dominadas pelas sensações, a própria fala pode adquirir um caráter sensorial. Sua função é a de proporcionar conforto, acarretando um estado mental de alguma coesão, através da sensação provocada pelo próprio “ato de falar”.
Fédida, (1991)3,1 descreve também a presença de defesas de tipo autístico em pacientes neuróticos manifestando-se através da fala.
Esse tipo de comunicação seja ela exclusivamente não verbal, ou verbal com caráter sensorial, provoca grande impacto na mente do analista. Assim como o analisando, também o analista contém em sua mente áreas primitivas, áreas de não-representação, uma “parte autística da personalidade”, como diz Tustin (1986). Frente à forte pressão destes estímulos, tende, da mesma forma, a utilizar manobras semelhantes às do analisando. Pelo fato de não lhe ser possível, muitas vezes, encontrar em sua mente representações que lhe permitam transformar aquele impacto em pensamento, reage através de evasão ou da manifestação de reações corporais.
Penso que o analista, ao trabalhar nessas áreas, é continuamente desafiado a refletir mais amplamente acerca do impacto sofrido diante desses fenômenos na sessão, quer permaneça na situação ou dela se evada. Tanto em uma situação quanto na outra, se requer que o analista crie alguma distância, “uma fresta”, Rezze (1997), em relação àquele impacto, de modo a poder elaborá-lo e talvez então vir a resgatar sua condição de pensamento.
É necessário salientar, entretanto, que estas reações do analista não são necessariamente decorrência de fenômenos de identificação projetiva exitosos, mas decorrem da angustia envolvida na situação.Nestas circunstancias forma-se um abismo entre os dois elementos da dupla analítica, de tal maneira que cada um deles permanece absorto dentro de si mesmo, habitando um universo próprio, sem que se estabeleça qualquer conexão entre eles. Para fazer frente a esta situação o analista pode, também, se envolver com atividades ligadas ao próprio corpo, com atividades mentais desvinculadas do cliente ou envolver-se ainda com o gozo pelo ato de falar, produzindo discursos longos que visivelmente atendem mais às suas próprias necessidades do que às dos pacientes, (Korbivcher, 2001). Outra possibilidade ainda, é que o analista, com o intuito de aliviar-se da angústia que estas situações lhe provocam, se recolha em teorias, na tentativa de se ancorar em alguma referência e assim atenuar o sentimento de desamparo. Penso que o uso de teorias nessa circunstância serve para afastar o analista do contato com o analisando e, além disso, o que se observa é que essas teorias assim utilizadas tornam-se inúteis.
Acredito que experiências dessa natureza colocam o analista diante de um universo desconhecido, sem referências estáveis com as quais possa se orientar. Isso pode vir a estimular o analista para desenvolver uma condição privilegiada para o trabalho de análise, solicitando-o a operar a maior parte do tempo com a sua “capacidade negativa” (Bion 1970). Nessa condição, o analista será levado a investigar de forma livre, sem qualquer amarra anterior o material oferecido por aquele particular sistema de funcionamento mental. A meu ver, é isso que pode levar à disciplina de “ausência de memória e desejo” (Bion, 1967).

III

A Teoria do Caos é uma nova ciência criada na década de 70 por físicos, astrônomos e economistas acerca da complexidade da natureza (James Gleik, 1987 ).
Diz Gleik (p.3):...

“Onde começa o caos a ciência clássica pára. Desde que o mundo teve físicos que investigavam as leis da natureza, ele sofreu também de um desconhecimento especial sobre a desordem na atmosfera... O lado irregular da natureza, o lado descontínuo e incerto, têm sido enigmas para a ciência”... “Essa teoria é uma ciência que permite que se veja ordem e padrão, onde antes só se observava aleatoriedade, irregularidade, o caótico”. Gleik cita Hofstadter, que diz: “um tipo fantástico de caos pode estar escondido bem atrás da fachada de ordem, da mesma maneira que nas profundezas do caos pode estar oculto um tipo de ordem, ainda mais fantástica”.

Penso que a citação de Hofstadter nos indica a necessidade de estarmos atentos não ao que está aparente, mas ao oculto, ao desconhecido ao que está para além das aparências. Acredito que nossa função como psicanalistas, - assim como a dos biólogos, economistas e astrônomos em suas respectivas áreas de investigação - é a de desenvolvermos de maneira aguda nossos instrumentos de trabalho de modo a nos mantermos atentos aos movimentos psíquicos presentes na sala de análise. Não é tarefa fácil encontrar meios de nos aproximarmos dos pacientes que estou descrevendo e alcançarmos áreas mentais que envolvem um grau de primitivismo tal que, muitas vezes, não podemos sequer reconhecê-las como elementos psíquicos. Muitas vezes somos colocados frente à “violentas tempestades” sem que tenhamos notícias do “bater de asas da borboleta” em algum lugar, parodiando o exemplo clássico e popularmente citado do “efeito borboleta” referente à Teoria do Caos. Dito de outro modo, nós não temos a noção de onde se originaram “as tempestades”.24,
Marilena Chauí ( 2000, p.257 ) menciona:

“Um cientista ou um grupo de cientistas começam a estudar um fenômeno empregando teorias, métodos e tecnologias disponíveis em seu campo de trabalho. Pouco a pouco descobrem que os conceitos, os procedimentos não explicam o que estão observando nem levam aos resultados que estão buscando. Encontram, diz Bachelard, um obstáculo epistemológico. Uma nova concepção científica emerge, levando tanto a incorporar nela os conhecimentos anteriores quanto a afastá-los inteiramente”.(Chauí, 2000 p. 15

Diz ainda:

“Em tempos normais, um cientista diante de um fato ou de um fenômeno ainda não estudado, usa o modelo ou o paradigma científico existente. Uma revolução científica acontece quando o cientista descobre que os paradigmas disponíveis não conseguem explicar um fenômeno ou um fato novo, sendo necessário produzir um outro paradigma científico até então inexistente e cuja necessidade não era sentida pelos investigadores”.

Frances Tustin, vivendo a experiência de isolamento frente a esses pacientes autistas, totalmente recolhidos em seu próprio mundo, foi capaz de observar em meio ao universo caótico das manifestações daquelas crianças, que elas muitas vezes se agarravam a “objetos duros” e a “objetos macios”. Levantou a hipótese de que a sensação tátil produzida pelos objetos duros se relacionaria a uma experiência sensorial de dureza e de contato com bordas e associou estas experiências com uma certa sensação de coesão corporal. Diz ela: “o contato com os objetos duros resulta numa experiência sensorial de uma “armadura“, propiciando um sentimento de proteção contra um pavor inominável”. Quanto aos objetos macios, ou “formas autísticas” como os denominou, levantou a hipótese de que estariam relacionados a impressões sensoriais deixadas por um objeto ou substâncias corporais que, ao tocarem a superfície da pele, propiciariam experiências reconfortantes e calmantes ”. Continua dizendo: ”estas são formas particulares, idiossincráticas”. Com base nessas observações, Tustin propôs que as relações de objeto no âmbito dos estados autísticos ocorrem de um modo particular, ou seja, ocorrem a partir das sensações que os objetos e formas autistas produzem no indivíduo e não a partir das fantasias ou significados que eles despertam. (Tustin, 1986).
Tustin, a meu ver, encontrou um “padrão”, uma organização, dentro de um aparente estado de caos, como havia nos advertido Hofstadter na citação acima mencionada.
Penso que situações clínicas com as características que descrevi, nos colocam desafios tais que não nos resta outra alternativa senão a de desenvolvermos um estado de mente despido de qualquer conhecimento prévio e a de tentar delimitar o universo particular daquele paciente. Então, poderemos imergir nesse universo. A partir daí talvez possamos observar, nos termos que Hofstadter propôs, algum “padrão” idiossincrático de organização, daquele sistema e assim adquirir alguma noção a respeito do vértice que o paciente utiliza para observar o mundo. Possivelmente, dessa maneira, algum diálogo com estas áreas de não-representação na mente possa vir a ser então estabelecido, e algum significado psíquico ser conferido àquele universo sensorial, para nós aparentemente caótico.
Diz Gleick (1987p.5):

“.o caos suscita problemas que desafiam os modos de trabalho aceitos pela ciência...” ”...Os primeiros teóricos do Caos, os cientistas que colocaram em andamento essa disciplina, tinham certas sensibilidades em comum. Eram sensíveis aos padrões, em especial os que surgiam em escalas diferentes ao mesmo tempo. Tinham gosto pelo aleatório, pelo complexo, pelas extremidades recortadas, pelos saltos súbitos”...

Além de Tustin, diversos autores pós-kleinianos, entre eles Bion, Winnicott, Bick, Meltzer e Ogden, Grotstein, Alvarez, bem como Mitrani e Houzel, têm se dedicado à investigação dos fenômenos proto-mentais, das manifestações autísticas a partir do trabalho com pacientes psicóticos e com crianças autistas, e também da observação de bebês. Estes autores se depararam na clínica com manifestações de fenômenos que se situam em áreas em que o nível de organização mental é anterior a posição esquizo-paranóide (Klein, 1946). Esse tem sido um campo pouco explorado pelas teorias clássicas da psicanálise.Também entre nós essa área de interesse vem sendo pesquisada por divesrsos analistas, entre eles: Haudenshield, T. Braga, M., Melega. M. Guimarães Filho, P. D., Fonseca V. R. Lisondo, A. D., Garcia de Barros, I.
Esther Bick (1986) e Meltzer (1975) através da noção de Identificação adesiva, Winnicott (1986) através de suas formulações acerca das angustias impensáveis, Ogden (1989) com a conceituação da posição autística-contígua, assim como Tustin, todos tinham, assim como os primeiros teóricos do Caos, eram sensíveis aos padrões...tinham gosto pelo aleatório, pelo complexo, pelas extremidades, pelos saltos súbitos... e, a meu ver, transitaram em áreas de caos, ou seja, como diz Gleick, áreas em que a ciência acaba. Com essas formulações fizeram tentativas de identificar padrões e de encontrar alguma ordem naqueles fenômenos, pois provavelmente se depararam com experiências nas quais os fenômenos predominantes não podiam ser explicados pelos conceitos contidos nas teorias vigentes (Chauí, 2000). Provavelmente foi essa disposição que os estimulou a prosseguirem as suas investigações. Esses autores têm oferecido contribuições importantes e têm nos auxiliado a delimitar cada vez mais os parâmetros desse campo, possibilitando-nos assim uma certa aproximação a esse universo desconhecido.
Sou levada, portanto, a indagar: teria Tustin, assim como os demais autores mencionados, através de suas investigações e novos conceitos, delineado um universo que contém uma organização interna própria? Seria esse universo – o universo autístico - regido por leis particulares, leis próprias, diferentes daquelas encontradas no âmbito da neurose ou da psicose e abrangendo uma área que as teorias clássicas não alcançam? Será que, como mencionou Chauí, “uma nova concepção científica emerge, levando tanto a incorporar nela os conhecimentos anteriores quanto a afastá-los” ?
A este respeito André Green (1997) 5, , ao se referir a Tustin, diz:

“Tustin influenciou não só aqueles interessados em problemas específicos dos estados autísticos, mas aqueles que também compartilharam uma intuição de que o autismo pode desempenhar o papel de um novo paradigma para o estudo da mente”. ...

Pierre Fédida (1991, p 1530) também diz:

“o autismo não é somente um modelo, mas ocupa a função de um verdadeiro paradigma teórico-clínico (e técnico), assim como ocorreu no caso da neurose na psicanálise e como pode ocorrer também com a psicose” .

Nesta mesma direção Eva e Rezze6, , também apontaram para o fato de que os fenômenos preponderantes nas transformações autísticas pertencem a um campo particular, um campo próprio, devido a sua característica de ligação com a esfera da sensualidade. Nesse campo, os referenciais teóricos são diferentes daqueles que encontramos nos outros grupos de transformações já abordados pela Teoria das Transformações. Esse oportuno comentário estimulou-me a refletir e desenvolver estas idéias onde destaco que o universo autístico pode ser considerado como um universo que contém uma organização interna própria, um universo regido por leis particulares, leis próprias, diferentes daquelas encontradas no âmbito da neurose ou da psicose, abrangendo uma área que as teorias clássicas não contemplam. Já os grupos de transformações propostos por Bion, transformações em movimento rígido, projetivas, em alucinose, em K, -K, em O, dada a qualidade dos fenômenos aí contidos, se situam num campo da neurose e psicose, compreendido pelo sistema consciente-inconsciente, pelo campo das relações de objeto, e pelo campo das emoções. Bion, segundo minha leitura, aponta para a possibilidade de se acrescentar à Teoria das Transformações, outros tipos de transformações, porém que para que o fenômeno autístico passe a ser incluído nessa teoria, é necessário considerar o fato de que está sendo aberta outra área de fenômenos que obedece a leis diferentes em que prevalece a sensorialidade. Nesse sentido, a principal indagação que faço é: como considerar o campo dos fenômenos autísticos em relação ao pensamento de Bion?
Bion, a partir da análise de pacientes psicóticos, diferencia a parte psicótica e a parte não-psicótica da personalidade. Dedica-se particularmente à investigação dos transtornos do pensamento, à parte psicótica da personalidade, transitando, segundo minha leitura, muitas vezes, por áreas próximas à dos fenômenos autísticos. Indago se em suas idéias podemos identificar áreas em que ele aborda estes mesmos fenômenos desenvolvendo outros conceitos.
Quando Bion introduz a idéia de elementos beta, de proto-mente, delimita uma área na qual poderíamos localizar os fenômenos autísticos, embora ele não os destaque nem os nomeie. Penso porém que os elementos beta não equivalem exatamente aos fenômenos autísticos, pelo fato destes últimos pertencerem a esfera sensorial sem vestígios de um psiquismo.
Um aspecto que poderíamos considerar em relação aos estados autísticos, a partir do pensamento de Bion é que os elementos beta constituem, ao lado das pré-concepções inatas (Bion, 1967), a gênese do pensamento. A função alfa, irá transformar os elementos beta em elementos alfa, tornando-os passíveis a serem convertidos em pensamentos. É possível que, se por algum motivo, as pré-concepções inatas, tanto da parte do self, quanto do objeto, ou da relação entre ambos, não puderem encontrar realizações, essa situação poderia precipitar o que Tustin (1981) denomina de “nascimento psicológico prematuro”. Nessa circunstância a criança, impelida a separar-se precocemente do objeto desenvolve manobras autísticas. Provê para si uma “concha protetora”, dentro da qual, ela através de atividades auto-sensuais se basta.
Do ponto de vista das categorias da grade, tanto no eixo vertical quanto no horizontal, indago: onde situaríamos o grupo de fenômenos autísticos? Necessitaríamos, como sugeriu Bion, criar uma nova grade para este grupo de fenômenos, a grade negativa, (Braga, J.C. 2004, comunicação pessoal) ou, talvez desenvolver uma grade de elementos beta, ou seja, estabelecer uma gradação dos elementos beta? (Korbivcher, 1999)
Bion introduz os vínculos emocionais L, H, K, para representar os três tipos fundamentais de experiência emocional à qual será aplicada a função alfa. Bion propõe também os vínculos negativos, –L, –H, - K dedicando-se particularmente à exploração da atividade da mente em –K e a define como uma situação na qual “o paciente quer manter ativamente a ignorância e que há vantagem em evitar a consciência” (Meltzer, 1978). Assinala a intenção que esses pacientes têm em provar a sua superioridade em relação ao analista. Com isso suponho que a noção de objeto esteja presente nesses estados, ou seja, -K não pertenceria à área autística. Indago porém, se os vínculos -L, -H, se relacionam a esfera autística, ou poderíamos conjecturar que no âmbito autístico a presença de vínculos emocionais não seria perceptível, ou talvez até mesmo inexistentes? Estaríamos numa área em que predominam os não-vinculos?

IV
Passo agora ao relato da experiência com dois pacientes que a meu ver, permitem observar o funcionamento da mente do analista na sessão ao operar em áreas em que os fenômenos autísticos prevalecem. Desse modo poderemos fazer a articulação entre a prática clínica e as idéias que vinham sendo desenvolvidas, e com isso enriquecer a discussão.
Vou expor o material clínico de uma criança autista de 4 anos de idade, Caio, que apresenta um atraso importante no desenvolvimento, principalmente na área da linguagem verbal. A seguir apresentarei Ana, uma mulher de 40 anos3, profissional de sucesso na sua especialidade, que opera a maior parte do tempo com a parte neurótica da personalidade (Bion,1957), embora evidencie núcleos autísticos importantes. A minha intenção é permitir através de Caio expor o contato do analista com a mente autista na sessão de análise, para em seguida, apresentar com Ana os mesmos fenômenos, porém em alguém que tem uma mente desenvolvida, possibilitando assim o contato com transformações autísticas, conforme denominei.
Caio era um menino lindo, moreno, forte expressando através do olhar ora vivacidade e presença, ora ausência e distância. Foi trazido pelos pais por apresentar um quadro de severo atraso no desenvolvimento da linguagem, embora se referissem a ele como uma criança muito esperta que, inclusive, podia ler palavras em letreiros, fato este que era fonte de muito orgulho para eles.
Caio exigia a presença da mãe próxima à sala de análise. Eu a convidava a sentar-se junto à porta do lado de fora. Caio manifestava algum interesse pelos brinquedos da caixa e excitava-se muito com eles, apresentando movimentos involuntários com os braços e ao mesmo tempo mordendo fortemente o dedo indicador, no qual já tinha se formado um enorme calo. A comunicação verbal de Caio dava-se através de palavras isoladas sem vinculação entre elas. Eram nomes de pessoas, de programas de TV. Nomeava-os de modo próprio. Referia-se aos brinquedos dizendo: Rrão, minhão, lelo, zul. Parecia um boneco de corda que, ao ser acionado, começava a funcionar. Ao deparar-se com qualquer dificuldade, puxava as minhas mãos como se eu fosse uma extensão da sua pessoa, para que eu solucionasse suas dificuldades. Em outros momentos Caio recolhia-se, se deitava no divã como um bebê, olhando para o além. Ficava muitas vezes totalmente absorto comendo excrementos que retirava de seu ânus, ou então resíduos do nariz ou de alguma ferida de sua pele. A minha ignorância frente às manifestações de Caio e ao seu mundo mental era total. Iniciei o trabalho com ele sem poder discriminar a área em que nos encontrávamos.
Em suas sessões, Caio, uma vez dentro da sala, abria a caixa de brinquedos, examinava-os, nomeava-os e em seguida colocava um lápis na mão da mãe. Através de alguns movimentos e de sua linguagem própria, Caio fazia com que a mãe rapidamente entendesse que ela deveria escrever numa folha de papel os nomes que ele pronunciava. Ele dizia: “mamãe, papai, vovó, bebê, bala, banbalalão, curumim, Caio, Célia” e ela os escrevia sob forma de uma lista numa folha de seu talão de cheques. Quando ela terminava, Caio, envolto numa atmosfera de enorme excitação passava a ler aqueles nomes. A mãe, tal como eu percebia, parecia vestir seu rosto com uma máscara que encobria qualquer manifestação de emoção. Ela obedecia às solicitações de Caio de maneira automática. Muitas vezes eu notava que Caio tentava agarrar-se em seu corpo, puxava seus cabelos, colocava-os na boca e ela não reagia. Dava-me a impressão de um ser inanimado. Ela decifrava os sons de Caio, falando e agindo por ele quando o filho queria expressar algo e não conseguia. Por ex: banco, binquedo. Ela pegava a chave do carro e perguntava: “Você quer comprar brinquedo na loja perto do banco quando a gente sair daqui ?”
Sentia-me exposta a um universo totalmente estranho para mim. Pouco a pouco, fui me familiarizando com as idiossincrasias de Caio e com o estranho universo ao qual fui sendo conduzida por ele. Muitas vezes me lembrava de um amigo daltônico com quem sempre brincava, indagando-lhe com curiosidade qual era para ele o tom que ele enxergava diante da cor verde. A resposta não me esclarecia em nada, pois seu referencial para as cores era outro. Era freqüente eu fazer a analogia da experiência que eu vivia com Caio com o fenômeno do daltonismo. Eu já intuía naquela altura que as referências que organizavam o universo de Caio eram diferentes daquelas encontradas em outros pacientes.
Após a repetição de inúmeras experiências como a que descrevi acima a respeito dos nomes escritos pela mãe e lidos por Caio, diante da minha vivência de estranheza frente àquele jogo, observei que, embora Caio se referisse a nomes de pessoas constantes naquelas listas, tais como papai, mamãe, tio X, curumim, esses se assemelhavam a sons reunidos, que formavam palavras desprovidas de significado e dissociadas de quaisquer fantasias aparentes. Pareciam ser apenas signos.
A grande habilidade de Caio para ler palavras parecia incompatível com a sua dificuldade em usar a linguagem verbal para se comunicar. Sua falta de desenvoltura para o desempenho de atividades simples, além de seus movimentos involuntários, tais como os de um bebê acentuavam essa discrepância. Tudo isso compunha um quadro bastante peculiar, sobretudo por que já havia sido descartada a hipótese de comprometimento neurológico. Frente às peculiaridades da comunicação de Caio que não pareciam ter qualquer significado simbólico, introduzi o seguinte jogo: Assim que a mãe escrevia a lista com os nomes e ele os lia, eu procurava um boneco na sua caixa que correspondesse, a meu ver, àquele nome e iniciava um diálogo dando vida às palavras. Eu dizia: “Oi, Caio, tudo bem? O tio X chegou, você quer brincar?” Ele se interessava por aquele jogo, tornando-se muito excitado. Foi assim que lentamente fui oferecendo a Caio algum “significado afetivo” para aquelas palavras-sons. Cada uma delas se associava a um personagem vivo e passava a adquirir alguma existência entre nós. Tenho dúvidas se chegaram a se constituir como símbolos, porém, com o passar do tempo, fui percebendo que o vocabulário de Caio aumentou um pouco e que ele começou a ser capaz de construir pequenas frases, articulando as palavras umas com as outras e se comunicando um pouco melhor.

Vou descrever agora a experiência com Ana, uma paciente adulta em análise há vários anos, atualmente numa freqüência de três sessões semanais. Ana é uma profissional competente em sua área de trabalho. Sua aparência é bastante cuidada. Seu olhar é distante, sua expressão facial denota certa “ausência de emoção”. Ao entrar na sala de análise, repete sempre com os mesmos rituais. Coloca a bolsa sobre o divã, ajeita-se vagarosamente, deita-se, arrumando a saia de um lado e do outro, cruza os pés e permanece imóvel num estado de silêncio absoluto, sem qualquer expressão de vida. Masca constantemente um chiclete e, além disso, com uma das mãos, manuseia o lóbulo da orelha. Frente a estes rituais sinto-me isolada, sem ninguém com quem me comunicar. Noto que preciso fazer um esforço consciente para me manter em contato e não me evadir da situação. Caso eu não intervenha indagando-lhe sobre o que ela está pensando, esta situação se prolonga. Algumas vezes, mesmo frente a essa indagação, Ana absolutamente não reage. A atmosfera vivida por mim na sala de análise é, na maior parte do tempo, de “vazio”, de “ausência de emoção”.
Numa sessão recente, ao chamar a paciente anterior, vejo Ana na sala de espera acomodada, envolta em alguma atividade sua. Ao chegar o seu horário convido-a a entrar. Está mascando chiclete. Entra, movimentando-se lentamente, e passa a obedecer aos seus rituais de arrumar-se sobre o divã. Ajeita a saia, a bolsa, cruza as pernas, e a lentidão de seus movimentos desperta a minha atenção. Após um longo tempo em silêncio e em total imobilidade, começa a falar com voz baixa, dando a impressão de ter recém acordado, como se falasse consigo mesma. Noto que essa sua manifestação, tanto com o corpo quanto em relação ao seu modo de falar, chega a me perturbar. Percebo que me atinge vê-la imersa num estado recolhido, “sem vida”, agarrada a rituais, sem qualquer sinal de estabelecer algum contato comigo.
Diz que esqueceu de trazer o pagamento. Logo me ocorre a lembrança de que a paciente anterior havia entrado com um envelope na mão e que talvez a sua lembrança se relacionasse com isso. Pensa um pouco e diz que, se eu quisesse, poderia fazer um cheque e pagar naquela hora.
Respondo-lhe dizendo que escolhesse como lhe fosse mais conveniente. Senta-se no divã e faz o cheque. Volta a deitar-se, e logo inicia uma longa narrativa no mesmo tom de voz anterior. Sinto-me tentada a interrompê-la e a mencionar toda a situação que havíamos vivido até ali, mas, sem que me dê conta, desisto e me deixo abandonar, imergindo na sua narrativa.
Narra de forma minuciosa que há muito tempo está com umas perebas no rosto, que ficam inflamadas, e que vem utilizando umas pomadas anti-inflamatórias, anti-alérgicas, mas que as perebas não desaparecem. Conta que esteve com vários médicos, e comenta a respeito da experiência com cada um deles detalhadamente. Acrescenta, por fim, que o último disse tratar-se de uma dermatite crônica que não tem cura e que é de fundo emocional causada por estresse.
Percebo que vou me exasperando com todos os detalhes com que me narra a situação. Lembro-me da sessão anterior na qual passou um tempo enorme falando sobre a sua relação com o guarda-chuva que havia trazido consigo. Aos poucos vou sendo tomada por um estado de muito sono, de enorme torpor. A reação que vai despertando em mim é de tédio, devido à pobreza da emoção e pela forma meio estereotipada de se expressar, e pelo seu estado de recolhimento. Percebo que, durante a sua narrativa, necessito combater o torpor e o forte impulso para dormir.
Ana conclui dizendo: “se o que eu tenho na pele é por estresse, se está relacionado com emoção, então o lugar para tratar é aqui”. Acrescenta ainda: “não sei por que estou estressada se acabei de voltar de férias, e, mesmo lá, eu fiquei assim. Só se foi a minha separação, se bem que antes de eu me separar eu já tinha isto.”
A força da concretude da sua comunicação é tal que provoca em mim um distanciamento da possibilidade de me indagar sobre quais conteúdos mentais estariam ali presentes.
Digo-lhe, em meio a meu estado entorpecido com certo humor: “então quer dizer que o negócio aqui é assim: se a “pereba“ é emocional, você é quem trata!” Digo-lhe ainda que percebo a sua dificuldade em estabelecer uma ligação entre o seu mundo interior, as suas emoções e as perebas da pele e que entendo que está pedindo a minha ajuda para isso. Continuo dizendo que tem a notícia de que o estresse aparece na pele, mas que não pode relaciona-lo com o seu mundo interior.
Ana, num tom de dor meio rancoroso, diz: é assim mesmo, eu não tenho a menor idéia, eu não sei como ir mais adiante. Noto que, quando Ana diz que “não sabe como ir adiante”, fico bastante aflita, porque vejo que eu também não sei.
Recolhe-se novamente, permanece em silêncio, imersa num estado de tal imobilidade, de tal ausência de vida, que tenho a sensação de estar diante de uma pessoa morta.
A esta altura encontro-me ainda meio entorpecida, mas, paralelamente, conscientizo-me do meu incomodo com o seu recolhimento, e com a ausência de uma interlocutora para mim. De súbito vejo que me encontro diante de uma encruzilhada; abandoná-la, ou seja, desistir, ou ir ao seu encontro. Noto então que o sono desaparece e resgato a minha condição de pensamento, de modo a me aproximar mais ao seu estado emocional.
Digo-lhe que provavelmente ela gostaria que eu fizesse a ligação que ela não pode fazer, a ligação entre a pereba e seu mundo mental. Acrescento que possivelmente ela vive um estado de medo, de terror sem saber bem de quê, ao qual não consegue nomear. Digo ainda que talvez ela tenha muito medo do que poderemos encontrar em seu mundo interior, se penetrarmos fundo, pele adentro.
Ela responde prontamente, num tom um pouco mais amistoso: “eu concordo, eu vejo que o meu medo é palpável, mas eu não tenho a mínima idéia do que é que eu tenho medo. Será da vida”?
Digo-lhe que talvez ela tenha razão, que tem medo de ser uma pessoa viva, de estar viva. Tem medo das suas emoções.
Ana recolhe-se novamente. Permanece em silêncio, praticamente imóvel, apenas mascando seu chiclete e manuseando o tecido do seu vestido. Aguardo. Mais adiante lhe indago a respeito do que estaria pensando.
Ela responde pensativa: estou pensando em emoção. Mas como é que eu posso ter contato, saber do que eu não sei?
Digo-lhe que parece estar aflita por perceber que as perebas na pele dão sinal de alguma dor na mente, mas que ainda não temos acesso a esta dor.
Percebo-me extremamente empática com seu sofrimento, sem encontrar meios para ajudá-la. A seguir, com certa perplexidade, me dou conta de que eu havia suprimido de minha mente toda a situação inicial do encontro. Resgato então a cena em que, ao chamar a paciente anterior, vi Ana ali envolvida com sua atividade, já presente para a sua sessão desde muito tempo antes de seu horário. Lembro-me da perturbação e constrangimento que eu vivi ao convidar a outra pessoa e não a ela e por vê-la ali sentada aguardando. Ao mesmo tempo surpreendo-me por verificar que a minha mente havia ficado paralisada e que toda aquela experiência havia se desvanecido momentaneamente e que eu me deixara abandonar imergindo na sua narrativa.
Tento transformar esta minha percepção dizendo-lhe que percebi que ela havia chegado antes hoje, que encontrara outra pessoa na sala de espera, que havia me esperado um longo tempo para ser atendida e que aparentemente estas experiências não haviam deixado marca, nem notícia de qualquer emoção. Acrescento ainda que, por algum motivo, notara que ela precisava congelar as suas vivências, a sua emoção, o seu ser.
Ela diz que apenas havia deixado aquilo tudo de lado por achar que não tinha importância e que ao me encontrar se lembrou que não havia efetuado o pagamento deste mês.
Indago-lhe como isso havia surgido para ela. Ela responde dizendo que, tendo aberto a agenda e visto que já era dia 10, achou que não estava certo não ter ainda efetuado o pagamento.
A força da concretude da sua resposta é tal, que acabo abandonando o meu intento de pesquisar qualquer fantasia sua quanto à paciente anterior que trazia um envelope na mão e sua emoção em relação ao pagamento. Apesar disso, menciono-lhe ainda o fato de tê-la visto com outra pessoa na sala de espera e indago a respeito daquela experiência. Ela diz que pensou que eu poderia estar incomodada por ela vir mais cedo, que ela estaria abusando e que não deveria ficar ali...
A partir desse momento noto que houve uma mudança no clima da sessão, parecendo-me que suas emoções haviam se descongelado um pouco. Ela passa então a expor seus medos, agora um pouco mais confiante.
Transmito-lhe aproximadamente esta idéia e avento a possibilidade de que ela pudesse se sentir acolhida, protegida, estando ali, na sala de espera, perto de mim; e que talvez receasse que eu percebesse e que isso me incomodasse.
Ela responde com energia e meio brava: “ai Célia, isto já é exagero! Eu não consigo ver esta relação assim como você diz.”
Comunico-lhe que parece assustar-se diante da possibilidade de que eu tenha me tornado uma pessoa importante para ela, e que com isso experimente emoções sem que saiba como lidar com elas, desenvolvendo formas para evitar estes sentimentos todos.
Para minha surpresa num tom sarcástico, Ana responde: “talvez eu seja meio chata, mas vocês analistas, são engraçados; se o paciente chega no horário, ele é obsessivo; se ele chega antes é ansioso ou é porque quer ficar mais; se você chega tarde, é... Você sabe que eu fico aqui porque a minha filha tem terapia no mesmo horário, então fico esperando. É verdade que eu poderia ficar na terapia dela, mas”...
Frente a esta sua reação, sinto como se eu tivesse sido arremessada para muito longe dali, o que desencadeia em mim um estado de desânimo; em seguida, porém, entendo essa sua manifestação como uma conseqüência do movimento anterior.
Digo-lhe que se nós nos aproximamos um pouco, ela vive muitas emoções e que não sabe o que fazer com isso, por isso provavelmente precisou me lançar para bem longe dali. Digo ainda que ela precisa encontrar meios para se proteger das emoções, se proteger de ser uma pessoa viva. Lembro-lhe que, como ela mesma havia dito, o seu medo é da vida, de ter consciência de que somos separadas, de que ali vêm outras pessoas que eu atendo.


V
Discussão
Considero que Ana, e Caio, provocam forte impacto na mente da analista, pelo fato de apresentarem fenômenos de natureza primordial. Ambos desenvolvem manobras autísticas como forma de proteção. Entretanto é preciso esclarecer que os níveis de desenvolvimento mental de Caio e de Ana são diferentes. Em Caio, predomina o funcionamento caracterizado como autismo patológico, não se observando portanto o desenvolvimento de uma mente em funcionamento. Neste nível não cabem transformações. Em Ana predomina a parte neurótica da personalidade, embora nela se evidenciem núcleos autísticos acentuados, que a levam, em muitos momentos, a operar com transformações autísticas, manifestadas através da sua “parte autística de sua personalidade” .
Com Caio, como descreve a analista, ela encontra um universo repleto de fenômenos que, a seu ver, desestabilizavam qualquer referencial conhecido com o qual pudesse operar. Através de experiências sucessivas no contato com Caio, a analista delineia a percepção de certo padrão na comunicação, “uma ordem dentro do caos”, como diria Hofstadter. Penso que isso é possível se o analista puder abandonar seus conhecimentos prévios a respeito de como a comunicação entre pessoas habitualmente se dá, exercendo sua “capacidade negativa” (Bion, 1970) e a disciplina de operar “sem memória e sem desejo” (Bion, 1967) e se puder igualmente conter o impacto ocasionado por estes estados transformando-os, talvez ele crie condições para imergir no universo mental daquele paciente, de modo a conhecer a sua organização e as leis que o governam.
Dentro desta ótica, entendo que as palavras pronunciadas por Caio não contêm um significado simbólico, como é habitual; constituem apenas sons, provavelmente imitativos, que não aparentam integrar nas palavras o seu sentido e o seu significado afetivo. São, como mencionei, apenas palavras-sons. Funcionam tão somente como estímulos sensoriais que proporcionam algum conforto a Caio, garantindo-lhe a manutenção de um estado mental minimamente coeso. Os nomes para Caio, segundo a analista, são sons à espera de uma mente que os transforme em conteúdos psíquicos, repletos de emoções e de significado simbólico, ou seja, que os faça transitarem enquanto palavras da esfera proto-mental para a mental. A analista vai se orientando pouco a pouco frente àquele universo “caótico”, introduzindo então os bonecos e os associando aos nomes pronunciados e listados por ele, de modo a conferir-lhes algum significado emocional. Enfatizo que o que irá orientar a analista na sua abordagem é a discriminação da qualidade de sua experiência emocional em andamento. A percepção da existência do universo inanimado de Caio, leva a analista à tentar penetra-lo estimulando a criança a revestir de vida aquelas “palavras” até então desprovidas de significado afetivo, de modo a “povoar” de seres vivos o seu universo mental.
É interessante ponderar ainda, como já foi dito, que os fenômenos predominantes em Caio não são apreendidos a partir dos referenciais clássicos da psicanálise, remetendo a analista necessariamente, à posição de ignorância frente à experiência que está vivenciando. Entretanto “os padrões” observados em Caio foram direcionados por determinadas invariantes teóricas e pessoais armazenadas em sua mente. Essas invariantes diziam respeito à convicção da necessidade do contato com outro ser humano. A analista tinha a percepção de que Caio havia se organizado como um ser próximo ao inanimado e que seria necessário que ele construísse um mundo mental no qual a sua linguagem concreta se transformasse numa linguagem simbólica. Era de seu conhecimento que, para que isto ocorresse, Caio precisava viver a experiência de relacionar-se com outro ser vivo, o que a estimulou criar o jogo dos nomes.
Ana, de início, se apresenta através de manifestações não-verbais. Comunica-se por meio de ações; tais como “vir mais cedo e permanecer no consultório”, os “movimentos ritualísticos”, a questão do pagamento. O universo não-verbal parece ser o meio através do qual lhe é possível informar a analista a respeito de si. O episódio da sala de espera provoca forte impacto na mente do analista. A fala estereotipada que se segue, repleta de detalhes, a princípio cumpre a função de proteger Ana, do contato com seu mundo mental operando com transformações autísticas. O estado de torpor toma conta da mente da analista, porém ela é capaz de operar uma cisão em sua mente e prosseguir pensando. Aqui considero que a analista passa de transformações em –K para transformações  K. Quanto ao conteúdo da fala, podemos escutar que Ana demanda auxilio explícito para que a analista converta elementos sensoriais, “perebas na pele”, em elementos psíquicos, em outras palavras, que exerça a sua função alfa e que transforme elementos beta, em elementos alfa, auxiliando-a a construir uma mente. A analista sintoniza com a sua dor ao sentir-se sem recursos para isso e se dá conta da sua própria dificuldade em ajudá-la. Tomando um certo recuo, a analista percebe que toda a experiência compartilhada por ambas no início da sessão havia sido “deixada de lado”. Suspeita então que este fato poderia informar sobre o funcionamento mental de Ana. Como diz a analista: “por algum motivo, não sabemos qual, ela precisa congelar as suas vivências, a sua emoção, o seu ser, as suas fantasias”. Esta percepção permite que se abra a possibilidade de investigação. Ana, a partir daí, expõe timidamente seus medos. Nessa cadeia de movimentos suponho que predominem na analisanda transformações projetivas e na analista transformações em K.
Em relação a Ana, a impossibilidade de encontrar um meio para adentrar em seu universo acarreta na analista emoções que vão desde desespero, irritação, tendência a evadir-se, até um estado de profundo torpor. Ana serve-se de sensações obtidas através do chiclete, do manuseio do lobo da orelha, do tecido do vestido, do ato de falar, como um meio de proteger-se frente ao desamparo por deparar-se com a analista, um ser vivo separado dela. Nessa descrição clínica devido a transformação da experiência emocional em curso, evidencia-se, a meu ver, transformações autísticas tanto da parte da analista quanto da paciente.

Com Ana, analista encontra-se frente a um universo em que predominam transformações autísticas. A analista relata que vive uma experiência emocional em que o desconhecido predomina. Para Ana, a experiência de vir mais cedo e de permanecer na sala de espera é aparentemente, transformada numa ação do mundo concreto sem um vínculo perceptível com qualquer emoção. Seu mundo interno parece inacessível. A experiência vivenciada pela analista de “ausência de emoção”, de “vazio afetivo”, de “isolamento” , permeia todo o campo, causando forte impacto em sua mente e a faz levantar a hipótese de estar diante de transformações autísticas. Diante dessa configuração, não lhe resta outra possibilidade senão permanecer na situação e aguardar até que seja possível encontrar um modo de penetrar na barreira autística. A pressão dos estímulos é de tal monta que, em diversos momentos, a mente da analista fica submetida aos movimentos da analisanda, como, por exemplo, quando a analista relata: frente a sua longa narrativa, sou tentada a interrompê-la para tratar de toda a situação que havíamos vivido até ali, mas, sem que eu perceba, desisto e me deixo abandonar... Reações corporais, de torpor, e conseqüentemente, uma tendência à evasão desencadeiam-se na analista. Sugiro que predominem da parte da analista transformações autísticas .
A analista em face à longa narrativa de Ana compartilha uma experiência na qual toda a emoção lhe parece congelada, sendo esta uma manobra que protege a paciente de sua vulnerabilidade diante da consciência da presença da analista como uma pessoa viva e corporalmente dela separada. Partindo da transformação da experiência emocional em curso, a analista comunica a Ana que, na sua opinião, a necessidade de se recolher talvez seja uma medida protetora ocasionada por terror, por medo da vida, “medo de existir”, como ela mesma havia reconhecido. Sua tentativa é auxiliar Ana a tornar suas manobras protetoras mais permeáveis e encoraja-la a aproximar-s mais da condição de “ser vivo”. Aqui podemos pensar que o pedido de Ana para transformar perebas em “emoção” informa sobre seu interesse em tornar-se uma pessoa com vida psíquica, escapando assim da bidimensionalidade da mente (Meltzer, 1975). A analisanda passa a operar com transformações projetivas.
A analista podendo operar uma cisão em sua mente, livra-se de seu estado de torpor e resgata sua função analítica. Partindo da sua experiência emocional, discrimina a natureza do fenômeno em curso e tenta aproximar-se do mundo mental de Ana. Esta, talvez, por se sentir acompanhada, torna-se menos inacessível ao contato. Nesse momento sua barreira autística fica mais permeável, passa a operar em outro nível, “em outro estado”, sentindo-se encorajada a “descongelar”, ou talvez a “humanizar” seu mundo interior, adquirir existência, sem que a vulnerabilidade a ameace tanto. Passa a explorar seus medos, como, por exemplo, quando diz: pensei que você poderia estar incomodada por eu vir mais cedo... ...achei que eu estaria abusando e que não deveria ficar ali. O campo entre a analista e a analisanda agora se modifica, passando a predominar na experiência fenômenos de identificação projetiva, transformações projetivas, embora se observem também elementos de alucinose, transformações em alucinose. Encontramo-nos agora em outra esfera, na esfera da psicose, não mais na esfera autística. Como seu estado de terror é intenso, Ana oscila entre estados maior permeabilidade e de menor permeabilidade, ou seja mais viva e menos viva. Por exemplo, quando a analista lhe sugere que talvez goste de estar ali próxima, Ana reage violentamente e retorna novamente ao seu refúgio autístico.
Destaco o fato de que tenho adotado como referência na minha prática clínica o vértice de trabalho no campo da experiência emocional, do desenvolvimento do pensar e a Teoria das Transformações como método de observação dos fenômenos dentro desse campo. Considerando a proposta das transformações autísticas, barreiras autísticas são construídas dentro desse campo para proteger o self primordial, de estados de terror frente à ameaça de desmantelamento. O analista na clínica muitas vezes defronta-se com uma barreira autística dentro da qual o paciente se recolhe e se basta a si mesmo através de atividades auto-sensuais. A sua tarefa passa a ser então a de se aproximar ao universo autístico do paciente e a de introduzir-se como uma “companhia viva” (Alvarez, 1992) buscando humanizar seu mundo interno. Em outras palavras, o analista tenta auxiliar o paciente a transitar de um universo proto-mental para um universo mental, utilizando a sua função alfa para transformar aqueles elementos sensoriais, concretos, em elementos mentais, em elementos alfa, plenos de vida emocional, de fantasias, passíveis de serem pensadas. Se pensarmos em termos da Teoria das Transformações, poderíamos supor que o paciente sai do campo das transformações autísticas e passa a operar com transformações projetivas, em alucinose, em K, -K, em O . É importante salientar também, que muitas vezes o que se observa é que as barreiras autísticas tornam-se mais permeáveis, ou menos permeáveis. Assim que o paciente sai do estado de recolhimento e se expõe, ele imediatamente gera nova proteção e aí se recolhe. Oscila constantemente entre estados de existir e de não- existir.
Levando em conta, então o fato de que o universo autístico constitui um universo particular, indago se para alcançarmos na clínica os fenômenos autísticos não seria necessário desenvolvermos instrumentos específicos, compatíveis com este tipo de manifestações, ou seja, se não deveríamos em primeiro lugar tentar auxiliar “ativamente” (Alvarez, 1992) o paciente a emergir de seu refúgio autístico, para posteriormente então tentar auxilia-lo a transformar as sensações em emoções, desenvolvendo a sua função alfa e a capacidade para pensar. Tanto com Caio quanto com Ana, há uma demanda de participação mais “ativa” da analista na sessão. Com Caio, a analista introduz o jogo dos nomes com a “intenção” de conferir vida àqueles sons de modo a tentar construir juntamente com ele, uma mente. Com Ana, a analista adota também uma “atitude ativa” e direta, quando se dá conta que ambas haviam suprimido o episódio do início da sessão. A analista tenta explorar com Ana o que ela havia vivenciado naquele então, com a intenção de estabelecer os elos emocionais até então ausentes.
Encerro este trabalho retomando a citação inicial de Gleick (parte III), a respeito das áreas de Caos quando diz: ”...desde que o mundo teve físicos que investigavam as leis da natureza, ele sofreu também de um desconhecimento especial sobre a desordem na atmosfera... O lado irregular da natureza, o lado descontínuo e incerto, tem sido enigmas para a ciência”...
Penso que esta citação reflete meu estado de mente ao encerrar um trabalho que abre para mim uma área de investigação sem limites, na qual ousei adentrar: a investigação da mente primitiva.


Agradecimentos
Agradeço em primeiro lugar, a João Carlos Braga, pelo estimulante diálogo e troca de idéias, a Alicia Dourado de Lisondo, por seus valiosos comentários, a Ligia Mattos por sua generosidade na atenta leitura e úteis sugestões que contribuíram para a redação final e a Maria Lucia Gutierrez pela sua cuidadosa revisão do texto.

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