Silvânia Mendonça Almeida Margarida
O autismo é como um mapa encoberto. Mapas
que encobertam as mais verdadeiras surpresas, tristezas felizes,
aprendizagens encantadas e judiciosas. Às vezes, todas as direções são possíveis e outras vezes os caminhos são os mais diversos, quase impossíveis.
Como nos diria Rubem Alves: "Aqui
se encontra o retrato deste mundo. Se alguém prestar bem atenção verá que há mapas dos céus, mapas das terras,
mapas do corpo, mapas da alma” e eu acrescento: mapas do autismo. São muitos. Quem notar poderá analisar cuidadosamente estes
mapas: aprender a falar, aprender a não se sentir sozinho, aprender a se
banhar, aprender a usar os talheres, aprender a escrever, desaprender as
garatujas, desaprender as estereotipias, desaprender a gritar. Quantos
mapas! Seria impossível enumerá-los aqui! Seria impossível enumerá-los numa única vida.
O autismo é uma carta geográfica para a vida dos pais e de seus
filhos! É uma lista descritiva de aprendizagem burilada e de renúncia! É a representatividade do que se tem de
mais belo, além do tempo, atemporal mesmo, e do espaço. Um espaço que para
alguns é de sofrimento. Para outros de aprendizagem. Bem pragmático! Somente o momento presente e a
crença crística importam. É só aprender.
Mas como avaliar a alma do autismo em
mapas¿ Uma interrogação de primeira instância, de cabeça para baixo na aprendizagem da educação especial?
Pais, irmãos, educadores, terapeutas e filhos
autistas por todos os caminhos já andaram. Já fizeram de suas vidas flores, como tal
são seus espíritos: proteção e dores, clamores e amores. E, assim,
cultivando, as flores dos mapas autísticos, nós, pais e mães de crianças autistas vamos cobrindo
as nossas feridas. Mesmo que os olhos-mapas das nossas crianças viajam
como seus olhares perdidos, em êxtase, em sintonia, em comunhão; em sonho projeto criança.
Os mapas autísticos trazem o cântico das flores do
vento, que volteia sobre os campos floridos. Os caminhos das nossas crianças são como pinturas celestes, suaves
encantamentos que inebriam o nosso ser e nossos sentidos.
Nos mapas do autismo NÃO EXISTE a tarefa do adulto que passa
a desempenhar uma função mediadora entre as crianças e a
cultura, garantindo o desenvolvimento infantil e o conhecimento social. Neste
sentido, o professor de Educação Infantil não precisa ter uma visão globalizante do desenvolvimento da
criança e do conhecimento social e historicamente produzido.
Nos mapas do autismo, o
professor da Educação especial precisa ir além. Precisa saber conviver com a alma autística daquele indivíduo e lhe mostrar primeiramente o seu
EU. A sua função mediadora vai além das perspectivas de uma visão globalizante do desenvolvimento
infantil, pois se passarão muitos anos e a criança se tornará um adolescente, um adolescente que
passará à idade adulta. Uma
idade adulta criança. O que fazer então?
Como mãe de um rapaz autista criança talvez eu
seja capaz de interpretar momentos que preleciono aqui:
- O que se diz ou faz, como se diz ou
faz, em que momento e o porquê afetam profundamente as relações professor-aluno autista,
influenciando diretamente o processo ensino-aprendizagem.
- Afetividade não se limita apenas a manifestações de carinho físico e de elogios superficiais.
- “as manifestações epidérmicas da afetividade lambida se
fazem substituir por outras de natureza cognitiva, tais como respeito e
reciprocidade.
- Adequar a tarefa às possibilidades do
autista, fornecer meios para que realize a atividade confiando em sua
capacidade que não pode ser medida ou desmedida.
- demonstrar atenção às suas dificuldades e problemas são maneiras bastante refinadas de
comunicação afetiva.
- Medo, angústia, ansiedade e frustração são sentimentos que desgastam o autista. A
serenidade e a tranqüilidade dos professores auxiliam na redução ou até na eliminação desses sentimentos desagregadores.
- Amar, amar muito a educação especial...
São tantos os mapas do autismo que o
professor da educação especial burila especializações e negociações, mudanças e inovações. Essas devem ser decididas
durante uma experiência intensiva em que sejam adotadas práticas pedagógicas mais adequadas e consistentes no
descobrimento dos caminhos, da carta geográfica que pode ajudar o autista na sua
convivência diária.
Afinal, aprendizes-autistas, para serem
bem sucedidos em suas tarefas escolhidas, precisam de comunicação. Precisam ser compreendidos, não avaliados, não julgados, não ensinados, mas sim MAPEADOS.
Pais, professores, terapeutas,
profissionais, familiares, em minha pequena experiência creio que o principal
Mapa é o do AMOR, bem incondicional, sem cobrança e com ousadia.
E novamente lembro-me de que
Rubens Alves um dia já escreveu: “Quem dança com as idéias descobre que pensar é a alegria. Se
pensar lhe dá tristeza é porque você só sabe marchar, como soldados em ordem
unida. Saltar sobre o vazio, pular de pico em pico. Não ter medo da queda. Foi assim que se
construiu a ciência: não pela prudência dos que marcham, mas pela ousadia dos que sonham. Todo
conhecimento começa com o sonho”.
E assim, mapeando o craque autista,
pois sim, quem tem autismo é um craque. Um craque da vida, que aéreo vem como
um helicóptero, um bimotor, ou um grande avião a cruzar espaço nunca dante visto.
Assim, o tempo vai passando e os mapas
do autismo vão sendo conhecidos e checados. A carta geográfica física, psíquica e biológica, espiritual mesmo adquire o senso
do cruzamento de não complicar a vida, mas evidenciar com as mãos o resultado aberto para a defesa da
síndrome.
Afinal, o original mesmo é chegar
nestes mapas sem ameaças e ser o campeão nos kilometros de vantagens da
aprendizagem, não somente em dois de abril, mas em todos os dias das nossas vidas, além
horizontes.