quinta-feira, 30 de junho de 2011

ORGULHOS ´MÚLTIPLOS' - no combate a todos os preconceitos





imagem publicada - Um cérebro,com seus dois hemisférios, visto de cima com suas circunvoluções coloridas de diferentes cores e matizes, trazendo a frase a seu redor: Every Brain is Beatiful (Todo cérebro é belo), que é uma imagem utilizada no Autism Pride Day, ou seja o Dia do Orgulho Autista, quando autistas norte-americanos, em 18 de junho de 2005, afirmaram: "Não nos tratem como "doentes”. Somos diferentes, sim. Mas não precisamos de remédio ou de cura, mas de uma chance de sermos nós mesmos..." (http://neuropride.livejournal.com/) . Esse cérebro ''diferente e colorido'' traz as cores do arco-íris, alusão a um símbolo hoje do direitos de pessoas LGBTT, com vermelho, amarelo, verde, azul e laranja reforçando a noção de diversidade de modos de ser e estar em nosso planeta Terra, também multicolorido.

"Da Igualdade - como se me incomodasse dar a outros as mesmas oportunidades e direitos que tenho, como se para os meus próprios direitos não fosse indispensável que outros também os tivessem", Walt Whitman (1819-1892) - Folhas das Folhas da Relva

Na continuidade da busca de demolição de todas as formas de preconceitos e discriminações, assim como homenagem, mesmo que tardia ao Dia do Orgulho Autista, pensei bastante sobre os múltiplos orgulhos que passamos a comemorar. E me perguntei por que temos de ter ainda ORGULHO? me lembrei da leitura afetiva dos primeiros textos de Frantz Fanon. Os mesmos textos que me despertaram o que é o Orgulho Negro. Hoje digo que ele está englobado pelo Orgulho Afrodescendente, em homenagem a um novo olhar contra todos os racismos.

Mas que orgulho é esse? é apenas brio ou reatividade à alguma forma de segregação ou humilhação que foi sofrida/inflingida aos meus ancestrais? Não, é o orgulho que passamos a ter quando nos identificamos, nos re-conhecemos e nos damos o direito à uma diferença. Como nos dicionários é quando passamos a 'ter um elevado conceito de si mesmo'. Ou seja re-existimos diante de qualquer forma, tipo ou ação preconceituosa.

É quando nos incluímos antes mesmo que nos ofereçam uma inserção condescendente ou por culpa. Cuidamos para não colar mais na nossa pele nenhum rótulo, estereótipo ou estigma. Nos orgulhamos, enfim, do que somos, como somos e por que queremos/desejamos ser/estar múltiplos ou singulares. E comemoramos publicamente, seja em Maio ou Novembro,e agora em Junho.

No dia 18 de junho comemoramos o orgulho de quem vive com um transtorno: o Autismo. Depois, com uma das maiores manifestações de massa, a Parada do Orgulho Gay, de São Paulo,comemoramos os que escolhem, experimentam, se orientam e vivem como Lésbicas, Transsexuais, Bissexuais,Transgêneros, Homoeróticos, Travestis, Gays, e outras formas de ser e estar que são aglutinadas, respeitadas suas diferenças, sob a sigla LGBTT. Já conseguiram sua replicação para além de São Paulo e afetaram todos os cantos do Brasil. Faça chuva ou sol, sem temor de quaisquer repressões policiais ou políticas do passado.

O movimento de Orgulho Gay nasceu de uma afirmação de direitos civis nos EUA. O Gay Pride Day tornou-se um dia para marcar a conquista dos mesmos direitos que todos os outros cidadãos e cidadãs tinham, têm e terão. O movimento de orgulho gay começou após a Rebelião de Stonewall em 1969, quando os homossexuais em bares locais enfrentaram a polícia de Nova Iorque durante uma disputa inconstitucional. A afirmação de direitos foi a progressiva conquista resultante de Paradas que estão sendo realizadas anualmente até hoje. O orgulho passou a ser afirmação contrária à vergonha imposta pelos preconceitos contra a homossexualidade e outras formas de viver as sexualidades humanas.

Assim como os homossexuais, também os autistas foram e ainda estão sob a preconceituosa visão biomédica de serem apenas ''doentes''. E, apesar de já se ter esclarecido que ambas condições devem ser, hodiernamente, compreendidas como apenas formas diferenciadas de orientação sexual ou de funcionamento do SNC (Sistema Nervoso Central) há um olhar preconceituoso que os discrimina.

O movimento Aspies for Freedom gerou a iniciativa do Dia do Orgulho Autista. Este grupo milita pelos direitos das diferentes formas de autismo, buscando a educação e publicação de esclarecimentos, bem como a conquista de políticas públicas dedicadas para estes sujeitos, tendo como combate principal a genêse de todos os preconceitos: a ignorância.

Os preconceitos, biopoliticamente, como formas exclusão, controle e poder, podem ser assemelhados aos Impérios. Estes recrudescem, enrijecem e envelhecem nos estertores de suas quedas. Tornam-se mais ríspidos, grosseiros, violentos e, defensiva e consequentemente, mais brutais. Desses processos naturalizados e institucionalizados nasceram, historicamente, muitas ditaduras e ditadores.

Estes herdeiros de tempos imperialistas no temor de que suas práticas macropolíticas e suas ideologias fossem demolidas, com a retirada de cada tijolo ou pedra de seus alicerces, aprenderam, com o tempo, a construção de Muralhas. Para alguns ainda deveríamos construir espaços segregados para autistas ou homossexuais, com muralhas invisíveis que nos protejam das fobias que despertam, em nós, diante de suas diferenças consideradas ''extravagantes'' ou ''fora das normas ou padrões''.

Estas são como as Muralhas da China de Kafka. Porém, com o tempo, tornam-se-ão prisioneiros de seus próprios cerceamentos, com fragilidades que reforçam seus engessamentos institucionais. No Brasil estamos assistindo o espetáculo proporcionado por representantes políticos e radicais religiosos contra todas as mudanças de paradigmas. Reagem de forma agressiva a qualquer mudança, principalmente quando estas autorizam a inclusão nos mesmos direitos os que por suas ideologias devem continuar em segregação.

Em muitos momentos nos sentimos orgulhosos nos novos tempos de Marchas e de Liberdades. Nos sentimos e nos autorizamos a sentir orgulhos que possam ser expressados ''publicamente". Por isso um dia para comemorar qualquer forma de Orgulho de ser ou pertencer é um dia muito especial para quem o vivencia. Na compreensão psicanalítica de Frantz Fanon, um homem martinicano e negro, só quando trabalhamos as alienações que são produzidas em nossas subjetividades é que começamos a nos libertar do que colonizou nossos inconscientes.

Como os ''multiplos orgulhos'' sendo cartograficamente exercidos também nos libertamos das formas como nos propõem, no social, a incorporação de modelos identitários que neguem as singularidades e as diferenças. Quando, caminhando e cantando, com garra e determinação, individual ou coletivamente, compartilharmos novos espaços de liberdade. Espaços que, segundo Toni Negri em carta a Guattari, situam-se no intervalo entre o poder e o saber, o espaço onde o amor, com o concebe Spinoza, pode ser a melhor ligação entre eles.

Por isso o tema da Parada Gay é instigante: Amai-vos uns aos Outros... Hoje, constitue-se para além dos conservadorismos religiosos ou dos falsos guardiões da moral, um espaço livre para a visibilização social desses cidadãos e cidadãs orgulhosos de suas orientações sexuais.

Com as recentes conquistas de direitos para pessoas LBGTT, que vão da união estável ao uso do nome social, também estão em movimento conquista de projetos de Lei para garantir a inclusão de autistas no campo educacional, protegidos pelos mesmos direitos que já dispõem as pessoas com deficiência. E conquistarão mais políticas públicas dedicadas aos chamados transtornos do espectro autista caso seja aprovado o Projeto de Lei do Senado de número 168.

E desejo que este número nos relembre um ano de grandes mudanças culturais e de transformações políticas, quando muitos de nós acreditávamos em um outro mundo possível, com o Sol sob o asfalto e gritávamos, contra todas as ditaduras e preconceitos: queremos apenas Paz e Amor.

Estamos agora cantando, novamente, como uma nova revolução molecular em ação, aos quatro cantos da Terra, em alto e bom som: Gay is Beatiful e Every Brain is Beatiful. E o novo paradigma ético e estético guattariniano se fará um rompedor das muralhas dos preconceitos redividos...

Em meus recônditos da memória continua o meu orgulho singular, na voz da saudosa Elis Regina: Black is beatiful... e quero continuar tendo o direito a ter meus ''múltiplos'' orgulhos...e repito Walt Whitman: "...como se para os meus próprios direitos não fosse indispensável que outros também os tivessem'' .

copyright jorgemarciopereiradeandrade 2010/2012
fonte: infonet.com.br

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